A história de Brendan Fraser foi contada e recontada no período da campanha ao Oscar, que lhe rendeu o prêmio de Melhor Ator por A Baleia. Não foram poucas as matérias e entrevistas que citaram os abusos que Fraser sofreu dentro da indústria. Se o filme de Darren Aronofsky foi a sua volta triunfal - muito mais pelo ator em si do que pelo filme problemático -, Família de Aluguel é uma produção que tem a cara do ator e mostra que ele ainda tem muito tempo de tela para ocupar nos cinemas.
Com mais de 1,90 de altura e dono de um dos sorrisos mais simpáticos de Hollywood - algo que chamou a atenção da indústria para um possível papel de Superman nos anos 2000 - o astro é perfeito para interpretar Phillip, um ator não muito bem sucedido, que vai para o Japão seguir uma oportunidade e acaba permanecendo por lá sozinho. Ele encontra uma oportunidade de emprego na companhia que “vende felicidade”, levando atores para viver papéis na vida real. Phillip acaba em dois trabalhos que vão mudar sua vida: fingir ser o pai de Mia (Shannon Gorman) e ser um jornalista interessado na história de Kikuo (Akira Emoto), um ator já idoso, que está sofrendo com perda de memória.
O serviço não é algo novo - ou inventado - e já existe no Japão desde a década de 1990, com os serviços de “família de aluguel” servindo como suporte emocional em diversas áreas, seja no trabalho, em círculos sociais ou, como o nome diz, dentro da própria casa. Werner Herzog também contou essa história em 2019, no ótimo Uma História de Família.
A diretora Hikari disse durante a apresentação do filme no Festival de Toronto que ela decidiu escolher Fraser para o papel após ver o ator em um telão, durante a estreia de A Baleia. “Eu tive certeza de que ele era o meu Phillip”, afirmou o contar que ele não esteve presente no dia por diagnóstico de Covid. A imagem do rosto gentil de Brendan Fraser na tela é a isca perfeita de Família de Aluguel. É praticamente impossível ser antipático com sua presença, com as trapalhadas de Phillip e qualquer momento de diálogo entre ele e os outros personagens é motivo para darmos aquele sorrisinho de canto de boca. Essa magia é pura e simplesmente de Fraser e a diretora entende isso desde o primeiro frame que ele aparece.
Hikari - que dirigiu episódios de Treta, da Netflix, e da ótima, e pouca assistida, Tokyo Vice - também faz do filme uma carta de amor à Tóquio. A mistura das belíssimas imagens da cidade, jardins, letreiros, Monte Fuji ao fundo e a etérea trilha sonora de Jónsi e Alex Somers tornam a produção um deslumbre visual para a capital japonesa. A cena das cerejeiras e outra com Kikuo encontrando uma árvore majestosa são daquelas para enquadrar. O mesmo vale para a forma como a diretora trata a cultura local, dos restaurantes às crenças, das festividades até o cotidiano da metrópole. Tudo é tratado com delicadeza, sem estereótipos americanizados e com uma simplicidade que chama ainda mais a atenção. Tudo é belo ou interessante por sua própria natureza, refletindo diretamente na jornada do protagonista de encontrar motivos para sorrir e fazer outros felizes novamente em atitudes básicas como uma conversa, uma partida de videogame ou um dever de casa.
Ainda que seja clichê e totalmente previsível dentro de suas viradas e decisões tomadas pelo protagonista, Família de Aluguel não precisa de muito mais para conquistar o coração do público. É uma história sobre a busca pela felicidade e estar aberto a fazer os outros felizes, que passa longe de ser piegas. Se o primeiro trabalho de Phillip, em um funeral, pode causar estranheza para a cultura ocidental, o segundo, para ajudar em um casamento, deixa tudo claro em sua jornada: todos buscamos a felicidade, independente de como, quando, onde e dos medos que podemos ter nesse caminho. Agora, imagina ainda ter a ajudinha de Brendan Fraser para isso?