A Lei da Anistia, de 1979, permitiu que muitos exilados políticos voltassem ao Brasil, mas, para fins de revisão histórica, ajudou a colocar a ditadura num limbo do qual até hoje o cinema nacional se ressente. Em Teu Nome, de Paulo Nascimento (Diário de um Novo Mundo, Valsa para Bruno Stein), é mais um filme a tocar no assunto.
em teu nome
em teu nome
em teu nome
A questão da distopia, constante na produção brasileira pós-Retomada, no caso de Em Teu Nome vê seu fluxo se inverter, num processo de mensagem patriótica: saem os personagens em constante diáspora, marcados pela inadequação, e entram aqueles que, despertados pela "realidade", descobrem que não há lugar no mundo como a pátria-mãe, por mais desnaturada que ela seja.
O principal deles é Boni (Leonardo Machado), estudante de engenharia que vive da mesada dos pais e adere à luta armada com um grupo de tipos clássicos (o professor racional, a mulher de aparência durona, o sindicalista enraizado, o extremista verborrágico). Rodado em locações no sul do Brasil, no Chile, no Marrocos e na França, Em Teu Nome não demora a transformar a anistia no seu tema central.
Passagem in loco por cenários estrangeiros, personagens baseados em figuras reais (o guerrilheiro João Carlos Bona Garcia, no caso de Boni), relatos documentais no começo e no fim do filme... Tudo isso visa dar ao bem intencionado Em Teu Nome um lustro histórico e sentimental, mas enquanto cinema o filme não se sustenta. Discursos simplificadores e encenação precária prejudicam qualquer potencial que a trajetória desses personagens poderia ter.
Esse tipo de coisa fica evidente logo, na forma como diálogos e situações impõem à força o conflito entre militantes e alienados. No começo do filme, Boni pinta palavras de ordem num muro, e na cena seguinte, por coincidência, ao voltar para casa, encontra um sarau onde no violão se canta "como é bonito o meu rancho".
E não basta sublinhar a questão - é preciso escolher um personagem para martelá-la, para lembrar que "tem gente sendo presa enquanto você estuda para a prova". No caso, o esquerdoide Onório (Marcos Verza), o tipo mais insuportável do cinema nacional desde Caio Junqueira em Seja o que Deus Quiser. Chega a ser cômico como Onório atravessa cenas andando, apenas para lembrar que "tem gente sendo presa". É um coro grego inteiro numa pessoa só (com direito a focos de luz teatrais nas cenas noturnas).
Sutileza é mesmo coisa rara do cinema nacional, mas Nascimento não apenas sobrecarrega os diálogos como negligencia dramas que poderiam crescer. O diretor insere uma cena gratuita - dois coadjuvantes entram numa igreja, fugindo da polícia - para iniciar uma subtrama romântica. Mas quando os dois personagens se beijam (e existe ali certo potencial, pelo contexto, pelo local do beijo), mal sobe a música e já corta para a cena seguinte. Pior: essa subtrama só volta a ser mencionada muito depois. Não há tempo fraco para assimilar o momento, nem interesse em acompanhá-lo - enfim, não há dramaturgia.
A partir da metade de Em Teu Nome, quando qualquer potencial se diluiu no longo esvaziamento dramático que é a espera pela anistia, a discurseira começa a irritar. Que diabos importa o cobre nacionalizado de Allende?
Não dá pra fazer milagre em 30 dias de filmagem, mas se a produção passasse menos tempo dentro de aviões para dar uma panorâmica na complexa política latinoamericana dos anos 70, talvez conseguisse prestar um pouco mais de atenção em seus personagens.