Filmes

Crítica

Crítica: A vila

A vila

02.09.2004, às 00H00.
Atualizada em 21.09.2014, ÀS 13H16

Um dos maiores medos das crianças é o "homem do saco", um cara que vem te pegar se você não comer tudo, ou então te leva embora se você ficar na rua até tarde. Varia de região a região, pode ter nomes diferentes, mas é uma das lendas urbanas que ajudam a manter as crianças na linha.

A Vila

A Vila

A Vila

A Vila

A vila construída para o novo filme de M. Night Shyamalan, diretor de Sexto Sentido, Corpo Fechado e Sinais, está aquém destes mitos modernos, afinal estamos no fim do século 19, em um lugar onde a revolução industrial ainda não chegou. Mas isso não exclui o local de ter seus próprios medos, no caso, criaturas conhecidas apenas como "Aqueles-de-quem-não-falamos". Existe uma espécie de acordo entre os camponeses e os "Voldemorts" que moram na floresta ao seu redor: os humanos não invadem os limites da mata e aqueles estranhos seres que assombram a vila não entram na pequena comunidade. Para controlá-los, existem rituais de oferenda de animais e, por segurança, algumas torres de sentinela, de onde os jovens montam guarda e patrulham as fronteiras entre um e outro.

Tudo ia bem até que certo dia os animais do vilarejo começam a surgir mortos. O conselho da vila, que reúne os mais velhos, convoca assembléia extraordinária para tentar entender o que está acontecendo. Será que o pacto foi quebrado e agora suas vidas estão em risco? Teria algum dos habitantes da cidadezinha invadido o território das bestas e agora elas estão fora do controle?

Esta é a idéia inicial da nova história contada por Shyamalan, diretor e roteirista de A Vila (The Village - 2004). Mas, como já virou rotina em seus trabalhos próprios, esta é apenas a ponta do iceberg. Acusado de ficar repetindo a fórmula de grandes reviravoltas em todos os seus filmes, o diretor de ascendência indiana não pode fazer outra coisa, a não ser se declarar culpado. Porém, vale lembrar que cada um de seus filmes tem uma história completamente diferente da anterior. O primeiro, aquele do menino que via pessoas mortas, é sobre fantasmas e família. O segundo era uma ótima história de super-heróis. E o seguinte falava de alienígenas e da fé. Desta vez, ele mostra como o medo pode afetar uma comunidade.

Estrelas do campo

A Vila é o primeiro trabalho de Adrien Brody a estrear no país desde que ele ganhou o Oscar de melhor ator por O Pianista. Crimes de um detetive (Singing Detective), o único filme que ele fez entre sua parceria com Roman Polanski e esta com Shyamalan, será lançado direto no vídeo agora em setembro. Aqui, Brody mostra seu talento no papel de um deficiente mental. Quem também tem problemas é Ivy Walker (Bryce Dallas Howard), filha cega do líder da vila, Edward Walker (William Hurt). Sigourney Weaver é subaproveitada como Alice Hunt, membro do conselho local e mãe de Lucius (Joaquin Phoenix), um jovem tímido, obediente, mas inquieto.

Além do ótimo elenco, Shyamalan soube reunir também uma excelente equipe técnica, que cuidou para que figurino e cenário remontassem à perfeição um pequeno vilarejo do século retrasado. Cada detalhe é meticulosamente pensado para que o espectador não perca o foco. Um bom exemplo é a inexistência de cavalos entre os animais, o que ajuda a "vende a idéia" de que os habitantes da vila não têm a menor intenção de sair dali.

E a fotografia de Roger Deakins (Uma mente brilhante, O Homem que não estava lá), junto à trilha sonora criada por James Newton Howard (Colateral, Peter Pan) embalam e criam o clima perfeito para o suspense, drama e (acredite) romance do filme.

"Mas se tudo é assim tão perfeito, por que tem tanta gente chiando?", você pode estar se perguntando. Shyamalan está agora andando em um terreno muito perigoso. Diferente de quando surpreendeu todo mundo em O sexto sentido, agora ele criou um fã-clube que quer ser surpreendido e isso nem sempre é possível. A expectativa criada é muito grande e tem mais lados negativos do que positivos. Se o espectador matar a charada muito cedo, o resto do filme fica sem graça, ou então, se ele achar que a explicação é pouco convicente, ele também sairá do cinema achando que pode pedir seu dinheiro de volta.

Talvez fosse a hora dele parar de brincar de Hitchcock e mostrar que pode fazer ótimos filmes também em outros gêneros (vale lembrar que antes da sua "quadrilogia das viradas", ele escreveu e dirigiu Praying with Anger, um filme semi-autobiográfico, e Olhos Abertos). Aposto que isso surpreenderia muita gente. ;-)

Nota do Crítico
Ótimo