Edward Berger não dá descanso ao tempo. Balada de Um Jogador é seu terceiro longa-metragem em três anos. Vencedor do Oscar com Nada de Novo no Front, conquistou o público e viu seu filme seguinte, Conclave, percorrer o mesmo caminho das premiações. Nesse meio tempo, ainda dirigiu Submerged, o curta imersivo do Apple TV+, feito para o Apple Vision Pro, prepara um novo filme, com Brad Pitt, para 2026 e segue como um dos nomes fortes para comandar o próximo Bourne. É uma sequência impressionante, principalmente se levarmos em conta o escopo das produções e, claro, a qualidade técnica envolvida nos trabalhos.
Em seu segundo trabalho com a Netflix, Berger retorna às adaptações, levando para as telas o livro de Lawrence Osborne. A história acompanha Lorde Doyle (Colin Farrell), um apostador compulsivo que vive em Macau e que precisa pagar uma dívida de milhares de dólares em apenas três dias. Para piorar sua situação, ele ainda passa a ser perseguido por uma investigadora (Tilda Swinton), que está atrás dele por uma fraude cometida no passado.
Berger repete o esmero visual de seus filmes anteriores, adicionando mais cores e brilhos ao se aproveitar dessa réplica de Las Vegas que existe na região autônoma ao sul da China. Luzes, neon, fogos de artifício e chamas preenchem a tela em quase todos os quadros. A fotografia vai desde a simetria perfeita e estática até movimentos de câmeras rápidos ou que acompanham Doyle por toda a extensão dos gigantes salões dos cassinos. O diretor consegue alguns momentos excelentes, especialmente nos primeiros 30 minutos e na parte final, quando monta uma tensa situação na mesa de Bacará onde o personagem pode perder tudo.
O filme, no entanto, sofre do mesmo mal de seu protagonista: a ansiedade. Colin Farrell está ótimo e transmite a loucura e o pânico de Doyle com talento. Suado e tremendo, o ator transita com perfeição entre o glamour-fake do “Lorde” e os delírios de quem está perdendo tudo e com uma dívida que só aumenta. A cena em que Doyle está no restaurante devorando uma lagosta sem nem mastigar direito, é ao mesmo tempo nojenta e desesperadora, uma metáfora perfeita do comportamento do personagem. O problema é que o roteiro de Rowan Joffe não consegue decidir se quer ser um drama, um suspense psicológico ou uma história de golpe. Há uma exaustão na repetição da situação de Doyle e uma mudança repentina de foco, que prejudica o relacionamento do personagem tanto com Dao Ming (Fala Chen) e Cynthia (Swinton). A primeira é a que mais sofre, já que o roteiro a tira de um ponto e a coloca em outro da trama de forma abrupta, e repete isso ao menos duas vezes.
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Dentro dessa ansiedade, Balada de Um Jogador torna uma história simples - pelo menos a do filme - em algo confuso, com decisões corridas, personagens que entram e saem sem ter, de fato, a força que o diretor acredita. Entretanto, há uma energia fantástica nas duas extremidades da história, carregada pela atuação de Farrell, o carisma de Swinton e mais uma trilha excelente de Volker Bertelmann, que tornam impossível não ficar curioso pelo destino de Lorde Doyle e o mundo iluminado, caótico e perigoso dos cassinos de Macau. É como uma aposta do Bacará que o protagonista é viciado. Uma mão de sorte que vence por poucos pontos, não quebra a banca, mas ainda sai com saldo positivo para sacar antes de ir embora.
[Texto publicado originalmente em 12 de setembro durante a cobertura do Festival de Toronto]