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Crítica

Aqui É o Meu Lugar | Crítica

Filme de Paolo Sorrentino com Sean Penn não procura um lugar, mas uma dor que combine com seu remorso

20.10.2011, às 10H14.
Atualizada em 29.06.2018, ÀS 02H37

Cheyenne nunca fumou cigarros - uma personagem de Aqui É o Meu Lugar (This Must Be the Place) diz que tabaco é coisa de quem quer ser adulto, e Cheyenne sempre fora infantil - mas abusou de todas as outras drogas concebíveis. Isso dá pra ver na cara e nos gestos do decrépito e milionário roqueiro oitentista, que Sean Penn interpreta com a maquiagem de Robert Smith e a leseira de Ozzy Osbourne.

aqui é o meu lugar

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O filme do italiano Paolo Sorrentino (O Crocodilo) tira Cheyenne da sua letargia - uma rotina de aplicar batom e lápis pela manhã, monitorar ações na Bolsa de dia e ser avistado por fãs pelas ruas de Dublin - quando o roqueiro descobre que o seu pai está morrendo em Nova York. Cheyenne não conversa com o velho há 30 anos, sequer segue a religião da família, mas recebe uma missão incontornável: encontrar em algum lugar dos EUA o velho nazista que humilhou seu pai em um campo de concentração na Segunda Guerra.

Aqui É o Meu Lugar é uma história de vingança, portanto, misturada com comédia dramática e road movie. Rapidamente descobrimos que o filme sofre, assim como Cheyenne, de um certo déficit de atenção. Questões são abordadas e deixadas pelo caminho (como a tentativa de Cheyenne de aproximar dois jovens solitários) e o que dá o tom é a estranheza. "Tem algo de errado aqui, não sei o quê, mas tem", fala o roqueiro o tempo todo.

Como diz a letra da música do Talking Heads que dá nome ao filme, "vamos criando à medida em que avançamos, pé no chão e cabeça nas nuvens". Sorrentino tateia o filme-de-redenção enquanto experimenta com elementos que não são necessariamente familiares entre si (o processo de regressão judaico tem pouco a ver com os temas típicos do filme de estrada americano, por exemplo), como se o seu longa fosse mesmo se construindo aleatoriamente, com a cabeça nas nuvens, a partir de situações catadas dentro de imaginários independentes (o imaginário da música pop, da Segunda Guerra, da América profunda).

A única coisa constante em Aqui É o Meu Lugar - e que talvez tenha algo a ver com a memória italiana do Holocausto - é seu profundo remorso. No fim das contas, Cheyenne não procura um lugar. Ele procura uma dor que seja legítima, que combine com seu estado de espírito, seu desejo de purgação. O roqueiro reclama que escrevia canções depressivas nos anos 1980 só pra ganhar dinheiro, e é em busca de uma dor de verdade - a do seu pai - que ele parte pelos EUA atrás de vingança.

Mas é possível sentir uma dor que não seja sua, uma dor transferida? Não seria essa dor - como a maioria das cenas de Aqui É o Meu Lugar, que parecem imitar a vida - uma mera projeção?

Aqui É o Meu Lugar | Trailer

Nota do Crítico
Regular