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Crítica

360 | Crítica

Novo filme de Fernando Meirelles mostra a dor de quem trai

17.08.2012, às 16H48.
Atualizada em 29.06.2018, ÀS 02H23

Trair é relativamente fácil. Basta uma briga mais feia, uma dose excedente de tequila ou um olhar enviesado para que a faísca chegue à pólvora. Difícil mesmo é conviver com as consequências de seu ato. A trama de 360, novo filme dirigido por Fernando Meirelles, não vem para analisar os motivos da traição, mas para apontar justamente os problemas que ela pode causar. Adaptação da peça A Ronda, o roteiro de Peter Morgan (Frost/Nixon, A Rainha) mostra que neste mundo globalizado em que vivemos, uma noite ao lado de uma prostituta na Bratislava pode repercutir em um casal desapaixonado que mora em Paris, em mafiosos russos e até em uma brasileira que, traída, pega suas coisas e resolve voltar para casa.

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O elenco utilizado para contar essas histórias é o primeiro destaque. Se Jude Law faz suas caras de maria-arrependida e Rachel Weisz vai da mulher decidida a terminar com o amante (o brasileiro interpretado por Juliano Cazarré) à luxúria ao seu lado em poucos segundos, precisamos destacar os trabalhos de Anthony Hopkins e Ben Foster, que contracenam com a brasileira Maria Flor, e o russo Vladimir Vdovichenkov.

Segundo Maria Flor contou ao Omelete, Sir Hopkins chegou ao set dizendo que neste filme interpretaria a si próprio, pois seu personagem lhe lembrara muitos fatos de seu passado. E o faz muito bem. Suas cenas não devem somar 15 minutos de tela, mas a franqueza de seus olhares vazios valem mais do que qualquer interpretação de galãzinhos de comédias românticas. Já Foster, adepto do método Stanislavski, é quem tem o arco mais interessante do longa todo. Recém liberado da prisão após cumprir pena por estupro, ele vive no limite do autocontrole e da tentação, e permite a Meirelles, o diretor de fotografia Adriano Goldman e o montador Daniel Rezende criar na telona suas sensações e paranoias.

Por fim temos a história de Sergei (Vdovichenkov), a mais completa. Ele sai de Paris, onde seu casamento com a espanhola Valentina (Dinara Drukarova) está com os dias contados, para viajar de carro até Viena. Na capital austríaca ele encontra seu chefe, o mafioso interpretado por Mark Ivanir. Depois de ser tratado como cachorro, como ele mesmo diz, Sergei se vê em uma encruzilhada que pode mudar sua vida. E faz sua opção. A metáfora da bifurcação é repetida no início e no final da história, fechando o círculo e mostrando que nossas vidas são construídas por escolhas.

Mas apesar do que o título pode deixar parecer, nem tudo volta para o mesmo lugar. Os personagens cumprem seus arcos, sejam eles mais longos ou curtos. Tem muita gente por aí dizendo que o filme é muito superficial, com personagens que não se aprofundam. Peço licença para discordar ao menos um pouco. Se pode causar um certo desconforto o excesso de "coincidências" que faz este grupo se tornar o círculo do título, cada drama pessoal ali fica bem entendido. Não há entrelinhas nas histórias. De um jeito ou de outro, todo personagem acaba tendo sua história contada.

360 é como um Babel, mas sem ser político. Sai de cena a bala perdida e entra no seu lugar o amargo sentimento de rever seu companheiro(a) após passar algumas horas com o(a) amante. São dores diferentes. São repulsas distintas e que igualmente levam à reflexão. Em vez de perguntarmos "que mundo é este em que vivemos?" a questão agora é "que relacionamento é este em que estou vivendo?".

Nota do Crítico
Bom