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A Morte Pede Carona

Refilmagem do clássico oitentista é bonita, mas inferior

16.08.2007, às 18H00.
Atualizada em 21.09.2014, ÀS 13H27

Confesso que me lembro muito pouco do A Morte Pede Carona, clássico do suspense de 1986 no qual um viajante solitário aceita dar uma carona a um estranho - que se revela um psicopata. Mas a cena dos dedos decepados na batata frita, icônica da imprevisibilidade, da insegurança e dos recursos do caronista assassino, não me abandona. Aliás, essas três sensações são justamente o que retive do filme - prova de que o diretor Robert Harmon fez um bom trabalho há vinte anos.

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Duvido um pouco que eu me lembre de alguma coisa da refilmagem homônima de 2007, do estreante Dave Meyers, daqui a duas décadas. O diretor não consegue reproduzir o clima do original, especialmente porque é demasiado esteta. As tomadas cristalinas, ora saturadas, capturando a amplitude do deserto do Novo México, apesar de belíssimas, afastam da produção a constrastante sensação de claustrofobia que me parece indispensável aqui. Faltam planos fechados, explorar melhor o interior do carro, seu confinamento, a vulnerabilidade do casal. Aliás, casal por que??? O filme original funciona melhor também porque tem apenas um viajante - o que leva a sensação de solidão ao extremo.

E a estética segue prejudicando a produção também na escalação de elenco. Os jovens viajantes, recém-saídos da adolescência, são bonitos demais, especialmente a irreal Sophia Bush (One tree hill), que passa o filme todo de microssaia, calcinha de oncinha e botinhas. Atores-colírio em filmes de terror arruinam o contraste - especialmente quando atuam limitadamente. Ao final do filme, a trama exige de Bush uma técnica que ela simplesmente não domina. O resultado é um tanto constrangedor - algo que tentam explicar com diálogo (!) - e podem surrar, sangrar e sujar a atriz que ela simplesmente não fica feia. Como mergulhar na história se a cada vez que ela surge há esse surto de beleza?

Comparado aos dois, Sean Bean aparece melhor, no papel que foi de Rutger Hauer. Mas o Boromir de O Senhor dos Anéis não exala o perigo de seu antecessor. Hauer tinha na década de 1980 uma ameaçadora aura de insanidade calculada que poucos atores conseguiram reproduzir desde então. Mas pelo menos a essência do personagem continua intacta - a ausência de motivação para seus atos segue intocada, algo louvável em tempos de fanatismo de roteiristas por passado de personagem.

Mas no geral, dá até pra se divertir com o suspense. Há boas perseguições (tão exageradas quanto o original), a cena final do caminhão está lá (mostrando o que só foi sugerido no filme de 86 - gosto dos dois) e a estética ao menos é agradável: O diretor não sabe filmar suspense, mas pelo menos sabe filmar.