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Depois de 25 anos de problemas, Terry Gilliam exibe The Man Who Killed Don Quixote em Cannes

Filme divide opiniões da crítica, unânime só em relação à bela direção de arte e à atuação de Adam Driver

18.05.2018, às 14H23.
Atualizada em 29.06.2018, ÀS 02H37

Dedicado a dois finados atores que quase entraram em seu elenco (John Hurt e Jean Rochefort), The Man Who Killed Don Quixote enfim foi projetado para o público, na tarde desta sexta-feira (18), no balneário de Cannes, após diblar uma ação judicial que quase tirou seu posto de filme de encerramento.

Não por acaso, o diretor Terry Gilliam abre esta dionisíaca releitura do clássico de Miguel de Cervantes com uma cartela de texto comentando a ação ("os produtores não sairão prejudicados daqui") e outra comemorado sua realização, na qual se lê, com humor: "enfim... depois de 25 anos de acertos e desacertos...". Assim começa a jornada pela cabeça de Quixote. Uma jornada que rachou opiniões.

Definido por alguns como um equívoco sem um pingo de graça e por outros como uma obra-prima, The Man Who Killed Don Quixote é uma releitura livre e pop do texto de Cervantes que incomodou tanto os detratores quanto os fãs mais aguerridos de Gilliam num ponto comum: a maneira rude como o Estado Islâmico é mencionado no roteiro. Uma vez que os mouros eram os inimigos da cavalaria europeia, Quixote se indispõe contra eles, o que, num filme passado nos dias de hoje, significa alfinetar os árabes. É um indício de que o cineasta vai ter mais problemas pela frente.

A única unimidade acerca de seu filme na Croisette, fora a grandiosidade de sua direção de arte, é a atuação (digna de Oscar) de Adam Driver como um Sancho Pança dos novos tempos. Jonathan Pryce esbanja romantismo como Javier, sapateiro de uma vila espanhola que, anos atrás, viveu Quixote no filme de conclusão de curso de Toby (Driver). No momento em que volta à Espanha, a fim de rodar um comercial, Toby se vê impelido a voltar às raízes. Por isso decide encontrar Javier, que, tomado pelo contato com as artes, passou a crer que é o próprio Cavaleiro da Triste Figura. Javier pensa que é Quixote e vê em Toby seu Sancho ideal, arrastando o garoto para lutar contra os gigantes do mundo de hoje.

Gostando ou não dos caminhos tomados por Gilliam, não há como negar o quanto o cineasta de Brazil, O Filme (1985) se recicla como narrador nesta empreitada pelo mundo da fabulação. Sua narrativa é ágil, arejada e louca, como nos bons tempos de Os 12 Macacos (1995), um de seus maiores êxitos.

Seu Quixote volta a ser exibido na cidade à noite, depois da premiação, que tem Capharnaüm, da libanesa Nadine Labaki, e BlackKklansman, do americano Spike Lee, como favoritos.