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Cultura Pop no Brasil | Curtindo a vida adoidado na prefeitura do cinema experimental

Dublador de Matthew Broderick no clássico da Era Ploc, Nizo Neto se reinventa como ator no papel de sua vida em O Prefeito, comédia política aplaudida na Europa

RF
01.10.2015, às 09H08.
Atualizada em 10.11.2016, ÀS 05H01

Voz brasileira de Ferris Bueller, imortalizada nos tímpanos brasileiros a cada reprise de Curtindo a Vida Adoidado na Sessão da Tarde, o carioca Nizo Neto encontrou no filme O Prefeito – aclamado na Europa em agosto, em sua passagem pelo Festival de Locarno, na Suíça - aquilo que a crítica chama de “o papel de uma vida”. Humorista célebre nos anos 1990 pelo papel de Seu Pitolomeu na Escolinha do Professor Raimundo, ele assumiu o personagem central da comédia política de Bruno Safadi. Com sessões asseguradas no Panorama Internacional Coisa de Cinema na Bahia (de 29 de outubro a 5 de novembro) e Semana dos Realizadores (19 a 25 de novembro), o longa-metragem subverte a cartilha do gênero mais popular do país não apenas por sua crítica aos (des)governos do país e à corrupção, mas também por sua experimentação formal.

Rodada nos escombros da destruição da Perimetral, uma das principais vias expressas do Rio, a produção - centrada nas loucuras de um governante – arranca de Nizo uma atuação histórica (e atípica) dentro da tradição das granes interpretações do cinema nacional. Filho do comediante Chico Anysio (1931-2012), ele tem uma atuação desdramatizada, ora propositalmente caricata, ora filosófica, no qual desfia um rosário de gestos para fazer rir e pensar, nas raias da poesia. É, talvez, o trabalho mais ousado de um ator visto este ano na seara do cinema nacional.

Este filme foi um desafio ainda mais por ser meu primeiro protagonista em cinema”, diz Nizo. “Tudo começou com uma grande surpresa de ter sido chamado pelo Bruno Safadi, que eu não conhecia. Mas minha formação, fora a TV, é muito teatral o que fez com que eu esteja muito habituado a trabalhar em projetos experimentais e de grande risco”.

Na trama de O Prefeito, Nizo vive um alcaide que sonha decretar a independência do Rio em relação ao restante do Brasil, tornando-se seu sumo-governante. Viciado em remédios, o personagem sonha ser um novo Pereira Passos (1836-1913), o político responsável pela revitalização urbanística do Rio entre 1902 e 1906. Mas a forma que o protagonista do filme de Safadi encontra para realizar seus sonhos de Poder é emancipar o Rio como nação soberana, mantendo os impostos locais – altíssimos – dentro do perímetro da cidade. A ideia, a princípio megalômana, concretiza-se graças ao apoio de aliados de governo que sonham dividir a receita dessa taxação carioca entre si, além de ganharem, cada um, uma rua ou um bairro do Rio para desfrutarem como quiserem. Aos poucos, contudo, o que seria um golpe escuso torna-se um governo revolucionário, tendo como sede os dejetos de aço e poeira da Perimetral.

São experiências variadas que formam o ator. Quando fiz o primeiro filme já tinha alguma experiência em TV e estava fazendo minha primeira peça. Quando comecei a fazer dublagem já tinha experiência em TV, teatro e já tinha feito meu primeiro filme. Esse pacote de estilos e linguagens ajuda muito o ator a crescer e se formar”, diz Nizo.

Segundo o diretor Bruno Safadi, Nizo trouxe para o processo de criação de O Prefeito sugestões essenciais à composição de um certo tipo de carioca do século 1920, que hoje já quase não existe mais. “Ele me trouxe os trejeitos, o bigode, o cabelo penteado para trás. A escolha do Nizo foi conceitual. Queria um ator de comédia, popular, que tivesse ligado a uma tradição de humor que há no Brasil e que não fosse uma dessas celebridades de hoje. Da fui ver Escolinha do Professor Raimundo e lá vi o Nizo. Ao pesquisar mais, vi que ele foi dublador de mais de 200 longas, tendo participado de desenhos como Caverna do Dragão (na voz do mago Presto). Ele foi da associação de mágicos, faz peça, tv. É um ator completo”, elogia Safadi, surpreso com a dedicação de seu protagonista. “Ele se entregou com muita paixão, como uma oportunidade mesmo e criou um superpersonagem. Foi tão forte a nossa parceria que penso em fazer mais um filme de O Prefeito, para poder seguir em frente com o personagem.”

Presença recorrente na televisão, em programas de humor ou em filmes dublados, Nizo estreou nos cinemas em 1980. “Meu primeiro filme foi Insônia, com base na literatura de Graciliano Ramos, que eu nunca vi. Tenho muita curiosidade em vê-lo, mas não acho esse filme em lugar nenhum. Minha primeira experiência em dublagem foi no quadro Bruce Kane, no Chico Anysio Show, dirigido pelo Orlando Drummond [a voz brasileira de Scooby-Doo]. Mas na minha carreira de dublador, o início mesmo foi no filme Uma Ponte Longe Demais, do Richard Attenborough, dublado na extinta Telecine”, diz o ator, que guardou com carinho uma lição de atuação do pai, Chico Anysio: "Ele dizia: 'Representar é a arte de não representar'".

Afrodisíaco documental 

Confirmado já no elenco da segunda temporada da série Magnífica 70, o galã nº 1da comédia erótica carioca dos anos 1970, Carlo Mossy está se reinventando pelas veredas  do documentário. Ator, diretor e produtor de grande sucesso de bilheteria, conhecido por sucessos como Giselle (1980), Mossy está finalizando dois projetos: Um Exótico Bar Chamado Garota de Ipanema Só Pelo Amor Vale a Vida. Ambos dão um tom novo à sua trajetória estética, ligado à investigação de fatos/ ambientes ligados à criação artística no Brasil.

No doc sobre Ipanema, ele faz um exercício nas raias da ficção. “É um filme sobre o que tem sido a importância do etílico, do álcool, na vida de consagrados multiartistas num bar. Reuni pessoas como Ziraldo, Jaguar, Luís Carlos Miele, Miúcha, Jards Macalé, Hugo Carvana, Paulo Cezar Saraceni, Zózimo Bulbul, Maria Lúcia Dahl, Fernando Pamplona, Maria Gladys, Chico Caruso e outros tantos, todos já devidamente filmados no bar mítico Garota de Ipanema, antes chamado Veloso”, explica Mossy.

Já em Só Pelo Amor Vale a Vida, produzido e dirigido por ele e por Mirella Spadon, ele faz uma espécie de documentário fabular, de timbres musicais, sobre a vida e obra do músico, maestro, compositor e poeta Zequinha de Abreu, conhecido pela canção "Tico-Tico no Fubá". O realizador escalou Leonardo Arena para viver Zequinha e Rossana Ghessa para encarnar Durvalina, a esposa do compositor. “Este é um filme que passeia pelo pretérito e pelo presente. Ninguém vê o Zequinha em suas passagens no presente. Mas ele assiste e admira suas músicas sendo tocada pelas mais variadas orquestras e bandas internacionais, autocriticando algumas delas”, diz Mossy.

Mesmo ligado à não ficção e à teledramaturgia, ele não abandona o papel de ator no cinema e faz uma participação no thriller Ódio, dirigido por Luiz Rangel, e ainda em fase de edição. Esta produção, que traz ainda Alcione MazzeoLuciano Szafir e Milhem Cortaz no elenco, é um remake de um longa homônimo estrelado e rodado pelo próprio Mossy em 1977, com inspiração na franquia hollywoodiana Desejo de Matar, com o saudoso Charles Bronson.

Zumbis na periferia

Codiretor do documentário-catástrofe Enchente (2011), Júlio Pecly, cineasta cadeirante morto em janeiro em decorrência de uma doença degenerativa, deixou um romance póstumo, escrito em alta voltagem de terror: Cidade de Deus Z. Editado pela Casa da Palavra/ Leya, com a grife da Festa Literária das Periferias (Flupp), o livro narra um levante de zumbis no complexo habitacional da Zona Oeste do Rio, deflagrado por conta de uma droga adulterada. O selo da Flupp rendeu ainda o thriller A Número 1, de Raquel de Oliveira, e o romance LGBT Sobre Garotos que Beijam Garotos, de Enrique Coimbra. Literatura das boas.

Animando palcos

Vista por mais de cem mil pagantes ao longo de uma década de carreira, a Cia Teatro Portátil vai comemorar seus 10 anos de estrada devolvendo aos palcos um de seus maiores sucessos: o espetáculo 2 Números. Sem palavras, calcada no uso de objetos como máscaras e bonecos, a peça ficará em cartaz de 9 a 31 de outubro no Rio de Janeiro, no Teatro Eva Herz, no Centro.

Cinema em Muqui

Apelidado de Fecin, o Festival de TV e Cinema do Interior do Espírito Santo, realizado em Muqui, promove sua quarta edição de 9 a 11 de outubro. Pelo evento passarão curtas-metragens de todo o país – como O Bom Comportamento (RJ), Do Meu Lado (RS) e O Filme de Carlinhos (BA) - e será apresentado ainda o longa capixaba Punhal, de Luiza Lubiana.

Ajuda aos gringos

Produtor-assinatura dos filmes do taiwanês Ang Lee desde A Arte de Viver (1992), o americano James Schamus contou com uma ajudinha brasileira em seu primeiro longa-metragem como diretor: Indignation. Estrelado pelo intérprete da franquia Percy Jackson, o talentoso Logan Lerman, o drama dirigido por Schamus, com base em romance de Phillip Roth, vai ser coproduzido pela RT Features, de Rodrigo Teixeira, o mesmo de Frances Ha (2013). Na trama, Logan é Marcus, jovem judeu que cresce às voltas com a Guerra da Coreia nos EUA dos anos 1950.

50 anos de Bigode

Em disputa pelo troféu Redentor de melhor filme na Première Brasil do Festival do Rio 2015 (que começa hoje) com Introdução à Música do Sangue, o diretor Luiz Carlos Lacerda, o Bigode, vai ganhar uma retrospectiva de seus longas-metragens no Canal Brasil. Tributo aos 50 anos de cinema do realizador carioca, a mostra entra no ar no dia 12 de outubro e segue até 9 de novembro, com sessões sempre às segundas-feiras. Serão exibidas produções como Mãos Vazias (1971) e O Princípio do Prazer (1979). O cineasta neste momento está finalizando seu mais recente longa: Lucio & Murilo, Murilo & Lucio (O Que Seria Deste Mundo Sem Paixão?), baseado em dois mitos da literatura nacional: o escritor Lúcio Cardoso e o poeta Murilo Mendes.

Justiça cega

Está agendada para 21 de abril a estreia de Em Nome da Lei, uma (bem-vinda) incursão do cinema brasileiro pelas veredas do thriller jurídico, com direção de Sérgio Rezende e distribuição assegurada pela Fox. Livremente inspirada na vida do juiz Odilon de Oliveira, a produção acompanha o combate ao crime empreendido pelo magistrado Vítor, vivido por Matheus Solano. Ainda no elenco, Paola Oliveira vive uma promotora e Chico Diaz um poderoso chefão. A fotografia é de Nonato Estrela

CURTA ESSA

Bola Para Seu Danau, de Eduardo Souza Lima: Um dos ganhadores do Prêmio Curta Rio, dedicado a histórias sobre a memória dos 450 anos da Cidade Maravilhosa, esta produção de seis minutos traz a irreverência e a poesia características do diretor de Rio de Jano (2003), copilotado por Renata Baldi e Anna Azevedo. A trama se desenha cinco meses antes de Charles Miller consagrar o futebol entre os brasileiros. No enredo, o técnico tecelão escocês Thomas Donohoe escalou uns colegas de trabalho da Fábrica de Tecidos Bangu para uma pelada, e deu o pontapé inicial do futebol brasileiro. O destaque do elenco é o humorista Marco Palito. Sua exibição pública está assegurada pela mostra Curta Cinema, que rola de 4 a 11 de novembro no Rio. 

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*Com DNA luso-pop-suburbano carioca, Rodrigo Fonseca é crítico de cinema, roteirista e professor de história das narrativas audiovisuais, com dupla cidadania na Terra-Média de Tolkien, e nos rincões da Atlântida de Aquaman. Michel Gondry é o seu Godard e a pornochanchada, a sua alegria nas horas de solidão.