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Entrevista

Banca de HQs | De Superfilhos ao Batman: a DC Comics de Jorge Jiménez

Ao Omelete, artista espanhol detalhou processo criativo e relembrou própria carreira

21.05.2021, às 15H45.

No mundo dos quadrinhos é muito comum discutir sobre como determinados autores mudaram os rumos dos universos de grandes editoras. Nesses debates, que muitas vezes giram em torno de grandes roteiristas, é possível cometer o erro de deixar os artistas de fora. E chamo de erro porque a parte visual de uma HQ é responsável por imortalizar grandes momentos no imaginário do leitor e dar vida ao texto. Nesse aspecto, é fácil apontar Jorge Jiménez como um dos desenhistas que mais moldou o Universo DC na última década.

Desde sua ascensão em títulos mais modestos como Terra 2 até assumir projetos maiores como Liga da Justiça, o artista espanhol deixou sua marca na editora ao ponto de ser escalado como o desenhista da principal HQ do Batman. Em entrevista ao Omelete, Jiménez explicou qual é o grande desafio em desenhar o Homem-Morcego:

“De primeira, o Batman pode parecer fácil, mas na realidade não é. O nível está altíssimo porque os melhores dos melhores que trabalham no mercado americano desenharam o Batman, então como pode fazer algo que se destaque ou esteja a altura de gente como John Paul Leon, Greg Capullo ou Jim Lee? É impossível”, afirmou.

Se o grande histórico do Cavaleiro das Trevas com grandes artistas pode assustar, Jiménez tem a seu favor uma grande bagagem adquirida em seus vários trabalhos para a DC Comics. “Eu geralmente vou de projeto a projeto”, explica. “Quando faço Superfilhos, crio uma versão de mim mesmo que consome animes e obras parecidos com essa estética. Quando faço Superman, tento me imaginar em sua atmosfera, que é algo mais sério, mas com cor e vida. Já quando faço Batman, apago a luz, me coloco em ‘modo detetive’ e tento que tudo seja mais bruto, obscuro e sério para me conectar com o personagem”.

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“No Batman, meu estilo de traço e tinta não tem nada a ver com minha versão desenhando Jon e Damian em Superfilhos, que também não se parece com Liga da Justiça. Para cada um deles tento fazer um reset de mim mesmo para me adaptar melhor ao projeto, ao invés de adaptá-lo a mim. Funciono assim”, explica.

Conforme Jorge Jiménez explica seu processo criativo, fica claro que essa versatilidade é tanto uma de suas virtudes, como também uma grande motivação. “Diziam ‘Jorge vai bem no Superman, mas não serviria para o Batman’. Achavam que porque trago uma estética característica para Superfilhos e Superman, eu não me adaptaria ao Batman”, relembrou.

“Como artista, é muito divertido tentar sair de mim mesmo e me reinventar para um projeto. Não gosto de dizer que algo ‘não é para mim’. Se eu torná-lo meu, no fim funciona e sai algo diferente. É por isso que agora estou fazendo Batman, e o considero um de meus melhores trabalhos. Porque mudo a chave e me adapto a ele”.

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Mais do que a “nova Arlequina”: conheça a Gancho

Apesar de estar no título do Homem-Morcego há um tempo relativamente curto, Jorge Jiménez já criou sua primeira personagem favorita dos fãs. Gancho surgiu com a complicada missão de ser a nova parceira do Coringa, posto anteriormente ocupado por um dos maiores fenômenos da DC: a Arlequina. O artista afirmou que entende a preocupação dos fãs, mas garante: “Não criamos a Gancho para ser uma substituta para a Arlequina, porque isso é impossível”.

“A Arlequina é a Arlequina, é a personagem mais divertida, mais louca e pessoalmente a adoro. E no arco Guerra do Coringa ela é quase um novo Robin para o Batman (risos), ela está em uma nova fase e em constante evolução. Já a Gancho, basicamente é uma personagem nova, com ideias novas e uma loucura diferente”.

Sobre o processo de criação da personagem, o artista relembra de ter recebido do roteirista James Tynion IV a instrução de imaginar “um tipo de Arlequina, mas totalmente diferente (risos)”. A ideia era lembrar a iconografia do Coringa de uma forma que fugisse de sua antiga parceira:

“Apostei em tons escuros, porque Arlequina é muito branca e colorida, enquanto a Gancho é mais fria. Experimentei com diferentes tipos de penteado, pesquisei quais roupas e cabelos estão na moda e me pareceu interessante”.

A resposta por parte dos fãs veio de forma quase instantânea. “Esperava que os leitores gostassem, mas não imaginava que aconteceria tão rápido. Fico assustado pela repercussão da personagem, quando vejo as cosplayers ou quando me pedem para desenhá-la. É uma loucura para mim, fico muito contente de que ela tenha ganhado os fãs com sua própria personalidade. É muito bonito”.

Superfilhos e o começo de tudo

Se hoje Jiménez é um dos artistas mais requisitados da DC Comics, muito se deve a Superfilhos. Apesar de ter Terra 2 como sua primeira fase longa na editora, onde celebra a oportunidade de ter desenhado todo o elenco de um universo cheio de versões alternativas dos heróis, foi a união entre os filhos de Batman e Superman que o levou a vôos maiores:

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“Devo minha carreira a Superfilhos. É provavelmente a HQ mais importante que fiz, porque foi uma catapulta. Foi quando muita gente conheceu meu trabalho, porque a aventura do Superboy com o Robin Damian Wayne funcionou muito bem”.

Para o artista espanhol, o projeto é especial também por uma razão muito pessoal. “Para mim, como fã do Superman, foi muito importante poder desenvolver seu visual e desenhar a relação pai e filho com Jon. Sempre serei agradecido ao título e aos fãs que sempre ficam felizes quando desenho algo relacionado a Superfilhos”.

Com brilho no olhar, Jiménez confessa que vê Jonathan Kent como uma espécie de filho seu também. “Sinto que ele se move e expressa como comecei a desenhá-lo em minha prancheta. Então é como se fosse minha criação, meu filho, mesmo sendo na verdade uma co-criação de vários artistas que também trabalharam nesse projeto”.

Um desafio chamado Liga da Justiça

Como o próprio Jiménez afirmou, Superfilhos foi uma importante vitrine para o seu trabalho. Dentre as várias pessoas que notaram sua arte estava Scott Snyder, grande roteirista da DC responsável por quadrinhos como Batman: Corte das Corujas e Noite de Trevas: Metal:

“Me lembro perfeitamente que quando estava fazendo Superfilhos, ele me escreveu pelo Twitter dizendo ‘adoraria fazer um projeto contigo, seria muito importante’. E lembro disso com muito carinho, porque estava conversando com um dos maiores escritores e ele estava me propondo um trabalho gigante”.

Questionado sobre a dificuldade em trabalhar em um título tão grande quanto a Liga, Jiménez explicou comparando com seu trabalho atual. “Em uma HQ focada em um personagem só, como o Batman, você centra sua força no protagonista e no vilão - por mais que tenham vários personagens ao redor. Já em quadrinhos com tantos heróis e vilões, como a Liga da Justiça, não pode faltar respeito com nenhum deles”.

Quando perguntado sobre qual foi seu momento favorito na revista, o artista espanhol escolheu o arco da Sexta Dimensão. “Tive a oportunidade de co-roteirizar esse arco, então coloquei uma cena em que Superman cruza o sol e vem da escuridão completa para chegar ao mar. É algo que eu queria contar e Scott Snyder tornou possível, e por isso o devo a vida”.

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Superman, o projeto dos sonhos

Ao final da conversa surge a clássica pergunta a respeito dos próximos projetos. Jiménez afirmou que segue firme à frente da revista do Batman, que ainda reserva grandes surpresas para os leitores. Porém, também revelou seu projeto dos sonhos:

“Superman é meu personagem favorito desde que era criança, digo isso sempre. E apesar de ter trabalhado com ele em algumas HQs junto com Patrick Gleason [no Renascimento] ou até na Liga da Justiça, sinto que não é o mesmo que fazer uma fase longa com ele, e espero fazer algum dia”.

“Atualmente não posso me queixar porque estou fazendo o Batman, outro grande personagem da DC Comics, mas é verdade que uma parte de mim quer chegar ao momento de ser o desenhista principal do Superman”, conclui.

Sobre a coluna:

O Banca de HQs é um projeto do Omelete criado por Gabriel Avila, Nicolaos Garófalo e Load Comics, com o objetivo de falar mais sobre o universo dos quadrinhos, desde os grandes clássicos, passando por artistas independentes e novidades desse meio. Após uma primeira temporada na Twitch, o Banca segue no Omelete com entrevistas, reportagens e análises semanais de tudo o que faz parte do universo dos quadrinhos.