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World Beyond promete nova visão do apocalipse, mas começa jogando no seguro

Embora exista uma nova dinâmica social regendo os EUA, a primeira geração que cresceu nesta realidade não trouxe (ainda) nada de muito diferente do que já foi visto

07.10.2020, às 09H32.
Atualizada em 09.10.2020, ÀS 19H39

Em 2014, quando The Walking Dead estava em sua quinta temporada, Gale Anne Hurd, a principal produtora executiva da série, veio ao Brasil para promover o trabalho e falou com os jornalistas sobre tudo que estava por vir. Estive na coletiva e minha maior curiosidade era saber como a série poderia nos surpreender, já que àquela altura, a impressão de que estávamos entregues ao ciclo de repetições já era grande. Gale foi categórica: “em time que está ganhando não se mexe”. Cinco anos depois, com a série em sua décima temporada, ficou claro que a produtora estava sendo absolutamente sincera.

Os fãs vão dizer que muita coisa mudou sim, mas, se pararmos para pensar bem, o que a série sempre ofereceu em troca da fidelidade dos fãs foram mortes chocantes e decisões arriscadas que nem sempre foram corretamente deliberadas. The Walking Dead tem um sistema de funcionamento clássico e nem mesmo seu derivado Fear The Walking Dead escapou disso. A promessa de mostrar “o mundo quando a epidemia começou” foi esquecida em menos de uma temporada e lá estávamos novamente com os personagens andando em círculos. Agora, uma nova chance aponta no horizonte. The Walking Dead: World Beyond veio para contar a história da primeira geração de jovens que cresceu no apocalipse. Mas, será mesmo que o novo derivado faz isso?

Scott Gimple, o nome que segurou a série original por um bom tempo, e o roteirista Matthew Negrette se uniram para idealizar World Beyond como uma alternativa limitada de expansão do universo. A série foi anunciada para ter apenas duas temporadas e, pelo que foi visto nos dois primeiros episódios, terá a função de amarrar pontas que provavelmente envolvem sim suas duas “irmãs” mais velhas. Com os Estados Unidos divididos em três grandes organizações sociais, todo o universo precisará ser situado dentro disso. A história de World Beyond começa na organização de Omaha; os personagens falam sobre uma outra bem grande em Portland e sobre a soberana, Civic Republic, que parece exercer liderança sobre as outras.

A promessa foi mostrar a primeira geração a crescer no apocalipse, mas a ideia logo foi enfraquecida pela evidência de que, embora tenham alcançado a maioridade depois da tragédia, todos os personagens têm memórias vívidas sobre como era a vida antes dos walkers. As irmãs Hope (Alexa Mansur) e Iris (Aliyah Royale) ainda eram crianças quando tudo começou, sofreram um grande trauma e reagiram a ele de maneiras distintas. Hope se tornou uma rebelde contestadora e Iris passou a vida tentando tudo para ser perfeita. O pai das meninas foi trabalhar para a Civic Republic e não voltou, o que leva as meninas a partir numa jornada para resgatá-lo. É claro que com elas vão o ingênuo Elton (Nicolas Cantu) e seu amigo Silas (Hal Cumpston). Essa “partida”, enfim, é que acaba começando o processo de contradições dessa ideia.


Always walking...

No primeiro episódio da série, somos surpreendidos por um clima realmente promissor. Por causa das comunidades organizadas na série-mãe, já sabemos como funcionam as engrenagens dessa nova maneira de construir uma sociedade. Mas, ainda que Alexandria e Hilltop sirvam como nossa referência, a morada de Hope e Iris tem uma estrutura muito mais detalhada e ampla. Bairros, carros, comércio, escolas... World Beyond apresentou em sua estreia uma nova dinâmica, em que a vida dentro dos muros está mais parecida que nunca com o que o mundo fora um dia. Mas, com um detalhe: qualquer um que morre ainda se torna um zumbi e os cuidados com isso e com as fronteiras ainda precisa ser redobrado.

Infelizmente, as coisas mudam no episódio seguinte. A missão de encontro com o pai faz com que Hope e Iris desloquem a trama para aquilo com o qual já estamos acostumados: personagens migram, passam por cidades desertas, têm diálogos filosóficos e eventualmente se livram de um ou dois ataques. O objetivo de revelar como a “primeira geração” lida com o apocalipse se reduz a repetir os mesmos códigos de sobrevivência, nos levando a uma pergunta simples: será que não seria melhor ficar na comunidade e explorar como se desenvolve a adolescência nesse novo mundo? Aparentemente, não. A não ser que o segundo episódio tenha sido uma recorrência isolada, World Beyond anuncia uma dramaturgia que em nada se difere do que já vimos na produção original.

Há alguns fatores que se mantém promissores. Os flashbacks são um bom recurso que nenhuma das outras duas usou consecutivamente. Matthew Negrette garantiu em entrevista coletiva que eles vão continuar aparecendo em todos os episódios. O recurso é o mesmo que Lost eternizou, com um foco específico em cada personagem, mas que, ainda assim, ajuda a dar ao programa uma identidade independente. O lider Felix (Nico Tortorella), por exemplo, foi o alvo dos flashbacks desse segundo episódio e isso ajudou bastante na compreensão do personagem. Felix é gay, Nico também (inclusive participou da versão Celebrity da Drag Race) e esse é só um dos sinais da preocupação dos produtores com a diversidade.

Um crossover é quase uma certeza. Temos alguns mistérios envolvendo a Civic Republic que provavelmente explicam muito do destino de Rick (Andrew Lincoln) e nessas duas temporadas, World Beyond deve convergir tanto com o universo de The Walking Dead quanto com o de Fear the Walking Dead, já que ambas as séries caminham para um final iminente. Todas as três devem ser encerradas juntas, o que pode ser o final que a franquia merece, depois de tantos anos de mesmice narrativa. World Beyond, como sempre aconteceu com o universo de Robert Kirkman na TV, se sustenta nas promessas que insinua. Porém, por enquanto, ela não é uma série sobre a “primeira geração”, não é um derivado com diferenças substanciais, não é um sopro de originalidade. Mas, diferente de suas “irmãs”, tem uma coisa que ela ainda é. World Beyond ainda é uma possibilidade.

The Walking Dead: Wolrd Beyond é exibido pela AMC às segundas-feiras, às 21h.

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