Made for Love se joga no absurdo no 2º ano, mas ainda triunfa pela humanidade

Créditos da imagem: Cristin Milioti e Billy Magnussen em cena de Made for Love (Reprodução)

Séries e TV

Crítica

Made for Love se joga no absurdo no 2º ano, mas ainda triunfa pela humanidade

Mantendo complexidade moral dos personagens, série abre espaço para o surrealismo

Omelete
4 min de leitura
23.05.2022, às 11H53.
Atualizada em 28.02.2024, ÀS 00H46

Made for Love é uma daquelas raras histórias de ficção que se embrenham pelo complicado tecido da realidade e tiram dele as linhas escondidas, tornando manifesto o invisível ou irreconhecido do dia a dia. A forma como a série de Christina Lee e Alissa Nutting sublinha a moralidade complicada do abuso, o seu enredamento pelas opressões sistêmicas da sociedade e pelas curvas mais escuras da psique humana, é alarmante em alguns momentos. Trata-se de um dos textos mais emocionalmente conectados e cortantes da TV atual - mas ei, Made for Love também sabe se divertir!

A 2ª temporada da produção, disponível no Brasil pela HBO Max, se deixa levar muito mais pelos conceitos fantasiosos possibilitados por sua ambientação pseudo-futurista. Sem querer estragar surpresas demais, podemos dizer que os novos capítulos de Made for Love incluem: um romance (curiosamente convincente) entre personagens de espécies diferentes; uma assistente virtual interpretada por uma celebridade dos anos 1980/90, que tira sarro da própria imagem de maneira brilhante; e uma dupla de inteligências artificiais tentando possuir corpos humanos e tomar controle da vida real.

É uma lista parcial, mas já dá para ter uma ideia do quão longe a equipe de roteiristas liderada por Lee e Nutting está disposta a ir, em notável contraste com uma primeira temporada que usava a ficção científica com parcimônia. Se, antes, Made for Love era um psicodrama cômico com comentários ácidos sobre a modernidade, que se apropriava do sci-fi como plano de fundo e gatilho de trama, agora ela abraça de vez a fantasia como forma de fazer esses comentários, e de ir ainda mais fundo em seus personagens moralmente dúbios, dolorosamente humanos.

A trama retoma de onde a 1ª temporada parou, com Hazel (Cristin Milioti) de volta ao QG ultra tecnológico da Gogol, empresa do seu ex-marido abusivo, Byron (Billy Magnussen). Ela está lá apenas porque seu pai, Herbert (Ray Romano), precisa ser tratado de um câncer terminal - e, ao menos no início, deixa bem claro para o ex-parceiro que não está disposta a retomar a relação e nem obedecer às mesmas regras que a transformaram em uma prisioneira durante o casamento.

Quem se delicia com as possibilidades de uma temporada quase inteiramente localizada no “hub”, apelido dado à sede da Gogol, é o designer de produção Jordan Ferrer. Refinando um trabalho que já era excepcional na primeira temporada, ele se apoia em chavões visuais da ficção científica futurista (luzes de neon, minimalismo, muito branco) para construir um mundo ascético que, ainda assim, não consegue evitar contatos significativos com o caos da humanidade. Colocando seus personagens para correr em pastos áridos, se divertir em um bar praiano ou passar uma noite em uma mansão antiquada, Ferrer e os diretores de Made for Love encarnam em imagens a tensão entre humano e artificial que existe no texto.

Segurando a primeira parte dessa equação, o elenco principal de Made for Love encontra novas formas de brilhar neste segundo ano. Cristin Milioti, por exemplo, segue transbordando sensibilidade na forma como expressa o trauma de Hazel, mas dá atenção especial à linguagem corporal da personagem nessa temporada. É notável (e tocante) a especificidade dos movimentos e posturas dela, especialmente conforme a protagonista se vê em situações novas e familiares de liberação e restrição.

Billy Magnussen, enquanto isso, se aproveita plenamente de como o finale da 1ª temporada expôs as inseguranças e profundas inadequações que geram o comportamento abusivo de Byron. Aqui, ele é um homem quebradiço, acuado, mas ainda obcecado, e ainda assustadoramente capaz de prender o objeto de sua obsessão em uma jaula irrespirável. Completando a trinca principal, Ray Romano se mostra a arma secreta da temporada, apoiando-se em uma honestidade emocional que é muito típica de suas performances para centralizar Herbert e a importância da jornada dele para a da filha.

Made for Love desembaraça, nesta segunda temporada, o segredo de toda boa ficção científica: nós, espectadores, só nos importamos com as loucuras que você quer nos apresentar se as pessoas experimentando cada uma delas parecem reais. Nem todas as viagens da série nesses oito episódios são bem calculadas, ou promovem os dividendos narrativos que os roteiristas parecem pretender, mas Made for Love permanece irresistível por seu insight impecável das dinâmicas complexas do amor e do abuso, e das linhas tênues (mas tão, tão claras) entre as duas coisas.

Nota do Crítico
Ótimo
Made for Love
Em andamento (2021- )
Made for Love
Em andamento (2021- )

Criado por: Alissa Nutting, Christina Lee

Duração: 2 temporadas

Onde assistir:
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