HQ/Livros

Artigo

Super-Homem: despedidas nos quadrinhos

Super-Homem: despedidas nos quadrinhos

03.08.2005, às 00H00.
Atualizada em 11.12.2016, ÀS 12H04
Superman 32 (Panini)

A edição 32 da revista Superman, lançada este mês pela Panini, marca o fim de uma era nas histórias do Homem de Aço no Brasil. Isso porque neste número foi publicada a última história que o roteirista Steven T. Seagle escreveu para o título americano Superman. A despedida encerra um ciclo, já que nos dois números anteriores da edição nacional quem deu adeus ao último kryptoniano foram Joe Kelly (Action Comics) e Joe Casey (Adventures of Superman).

Embora tenham assumido seus postos em momentos distintos, os três são representantes da nova direção do título iniciada em 1999, na qual Jeph Loeb e Joe Kelly eram os expoentes e possuíam uma visão comum. O objetivo dos roteiristas era evoluir as bases estabelecidas por John Byrne e seus seguidores para conseguir um Super-Homem mais humano - conseqüência de sua criação por Jonathan e Martha Kent - ao mesmo tempo em que resgatariam a magia e a grandeza perdida da Era de Prata dos super-heróis.

Pesando os altos e baixos, é justo dizer que o saldo foi positivo.

Comecemos por Joe Casey, que teve sua despedida em Superman 30. Roteirista de competência, mas que nem sempre consegue sintonia com o público, Casey trabalhou na revista do mutante Cable e passou pelos WildCATS. Atualmente, escreve uma série que mostra estudantes numa escola para jovens super-heróis chamada The Intimates. Seu Super-Homem foi essencialmente um pacifista, remetendo a uma época em que não era preciso nenhum murro para termos uma história de qualidade.

Agridoce, seu conto final foi um perfeito misto de humanidade com magia e muito carinho pelo personagem. Até os mais críticos devem admitir que ele conseguiu se redimir de seus momentos menos inspirados e desconexos. Publicada originalmente em Adventures of Superman 623, a história começa com o Super-Homem levando Lois Lane para conversar e discutir suas vidas - obviamente, voando pelo mundo. Quem apostava num drama doméstico estilo telenovela, contudo, não poderia estar mais equivocado. Nosso kryptoniano começa narrando algumas de suas aventuras mais inusitadas. E o que poderia ser mais encantador do que o Super-Homem ajudando Papai Noel a entregar presentes após um vírus ter afetado suas renas? Ficamos sabendo também da ocasião em que a Terra se tornou um organismo unicelular que começou a se dividir, além da história clássica O segredo do zagueiro fantasma, coincidentemente a mesma que foi escolhida para o tributo a Julius Schwartz. Como destaque, temos também a visita do Super com Lois à cidade natal de Friedrich Nietzsche, o filósofo que cunhou o termo Super-Homem para designar o ser humano superior desprovido de ética, conceito este que foi aproveitado pelo regime nazista de Hitler. Mas o melhor vem no diálogo do casal, quando o Maior Herói de Todos os Tempos expõe suas fraquezas e inseguranças numa cena de amor verdadeiro. Paralelamente, temos imagens de como ele inspira pessoas comuns a praticar atos heróicos. Simplesmente uma bela história que não será esquecida.

Passemos a Joe Kelly, cuja última história como roteirista regular do personagem foi em Superman 31. Saído de títulos da Marvel, como Demolidor e Deadpool, além de uma temporada com os X-Men, era mais conhecido por suas piadas de teor adolescente. Algo que, conforme revelou posteriormente, quase prejudicou sua carreira e sua contratação como roteirista do Super-Homem. Felizmente, o editor Eddie Berganza confiou em seu talento e Kelly fez um excelente trabalho com o Homem de Aço. O escritor soube mesclar doses de ação e humor inteligente a situações dramáticas e apimentou o relacionamento entre Lois e Clark. São de sua autoria duas histórias que já podem ser consideradas clássicos contemporâneos. Publicadas respectivamente nas edições comemorativas Action Comics 775 e Action Comics 800, a primeira, trata de uma reação a um grupo moldado à imagem da Authority no Universo DC e a segunda faz uma retrospectiva da origem de Clark Kent, entremeada por vinhetas do Super-Homem como ícone no mundo real.

Curiosamente, O giro da meia-noite, história publicada originalmente em Action Comics 810, também começa com o Super-Homem voando com Lois Lane ao redor do mundo, mas por um motivo diferente: acompanhar a virada de ano-novo de diferentes cidades do planeta. Em paralelo, temos o herói atendendo aos pedidos de cartas de diferentes localidades. Convém dizer que a idéia não é original nem respeita a cronologia estabelecida. Nada mais é do que uma renovação das tradicionais histórias do Correio de Metrópolis, redigidas por Dan Jurgens, com o Natal sendo trocado pelo Reveillon. Mas o texto de Kelly não deixa de emocionar. Acompanhamos o Super-Homem ajudando a realizar um parto em Ittoqqortoormit, na Groenlândia, levar alegria e proporcionar uma declaração de amor no Rio de Janeiro e a voar com crianças em Marioka, no Japão. Deixando a narrativa mais pesada, temos um criminoso neonazista, um doente terminal e uma instalação dos fuzileiros navais que enfrenta a revolta do povo ao tentar construir uma nação. A história é mais uma amostra de que Último Filho de Krypton continua cumprindo sua função original de ser uma resposta aos anseios e aspirações da humanidade, a realização de nossos sonhos.

Finalizamos com Steven T. Seagle. Autor veterano da linha Vertigo da DC Comics (para a qual escreveu Sandman: Máscara do Mistério e Casa dos Segredos), Seagle também teve uma temporada com os X-Men. Relutou em assumir o título Superman, mas não resistiu ao maior ícone dos quadrinhos. Entrou como substituto de Jeph Loeb, quando este saiu para preparar o título de estrondoso sucesso Superman/Batman. Estreou num especial 10-Cent Adventures, vendida ao preço de dez centavos de dólar. Seu objetivo foi enfatizar o Super sobre o Homem num pano de fundo de ficção científica. Criou uma nova Supergirl, Cir-El, que foi mal-recebida pelo público, e ficou marcado também por assinalar os superpoderes do herói nas caixas de narração quando em uso: vôo, supervelocidade, etc. Escreveu a graphic novel Its a bird para o selo Vertigo, que de certa forma trata de sua experiência pessoal com o personagem.

A última história do Superman foi publicada originalmente na edição comemorativa Superman 200 e tinha um texto mais sombrio que os dois analisados anteriormente. Tratava-se da continuação do que havia começado na edição anterior, na qual uma versão futura do Super-Homem aparentemente causava surtos de violência na população, quando na verdade tentava dissipar os efeitos de um café contendo nanomicróbios neurais. O Super-Homem do presente é chamado a viajar ao futuro para evitar um destino devastador para a humanidade, no qual, inclusive, Lois Lane morreria. Os fãs mais atentos percebem a alusão ao filme Superman (1978) estrelado por Christopher Reeve e dirigido por Richard Donner, com o conflito do herói em interferir no curso da História por amor à sua mulher. A trama também remete aos clássicos modernos Reino do Amanhã, de Mark Waid e Alex Ross, e A Pedra da Eternidade, arco de histórias da insuperável Liga da Justiça de Grant Morrison e Howard Porter, ao mostrar o efeito da tragédia no kryptoniano. No final, temos revelados os dois maiores inimigos do herói como responsáveis pelas desgraças em questão e o destino da nova Supergirl, que teria mais impacto se a personagem não fosse tão impopular. Ainda assim, a carga dramática da história é bastante envolvente.

Podemos afirmar que Steven T. Seagle, Joe Casey e principalmente Joe Kelly, com resultados variados, cumpriram a tarefa que é considerada uma das mais difíceis no mundo dos quadrinhos: narrar as aventuras contínuas do primeiro e maior super-herói mostrando mais do que apenas cenas de lutas e situações cotidianas. Enquanto aguardamos as novas equipes criativas, deixo registrado aos três roteiristas votos de sucesso em suas carreiras e um sincero agradecimento por nos fazer continuar acreditando.

Omelete no Youtube

Confira os destaques desta última semana

Omelete no Youtube

Confira os destaques desta última semana

Ao continuar navegando, declaro que estou ciente e concordo com a nossa Política de Privacidade bem como manifesto o consentimento quanto ao fornecimento e tratamento dos dados e cookies para as finalidades ali constantes.