
É um pássaro? É um avião? Não, é o... Ops!!! Super-herói errado...
Começando de novo, então: nem avião, nem pássaro. O sujeito aqui enfocado não é nada disso. Muito pelo contrário. Passa longe da graça das aves ou da aerodinâmica dos aviões. E nem mesmo de um super-herói se trata, pelo menos da forma como os norte-americanos definem essa espécie sui generis de personagens dos quadrinhos (embora até pudesse ser, à primeira vista, classificado como tal...).
No fundo, enfoca-se aqui uma criatura criada para ridicularizar os super-heróis em todos os seus aspectos risíveis. E nisso ela encontra farta fonte de inspiração, pois, pensando bem, é difícil encontrar algum aspecto nessa criação dos quadrinhos que não possa ser, eventualmente, sem grande esforço, definido desta forma.
De fato, Overman, a bizarra figura que dá origem a estas considerações iniciais, tem tudo o que um super-herói costuma ter: capa, músculos avantajados, botas, luvas, máscara, colante de cores espalhafatosas, cueca por cima das calças, etc. No entanto, deles, o grandalhão se diferencia por sua proposta anárquica, representando uma das melhores paródias já feitas ao gênero com o qual as histórias em quadrinhos costumam ser mais relacionadas.
Talvez tanto escracho seja uma injustiça para com uma boa parcela das histórias em quadrinhos publicadas no mundo inteiro, e, certamente, tal proposta criativa poderá não agradar muito aos amantes do gênero. Mas, por outro lado, ela também pode ser vista como uma homenagem à extensa variedade de superseres dos quadrinhos. Afinal, como já falaram muitas vezes, a sátira é talvez a melhor forma de homenagem que se pode prestar a alguém...
Isto talvez não esteja muito longe da verdade. Uma das muitas criações bem humoradas do genial quadrinhista brasileiro Laerte Coutinho, Overman traz em si uma evidente familiaridade com o gênero, cujas mazelas disseca sem piedade. Assim, em vez de um milionário que vive em uma mansão, sob a qual dispõe de uma imensa caverna onde colocar os seus diversos apetrechos tecnológicos, o herói nacional mora em uma pensão no Ipiranga, dividindo o quarto com seu amigo Ésquilo. Em vez de ter a mente sempre alerta, deixa-se enganar facilmente por amigos e inimigos. Longe de ser um poço de virtude, é vítima fácil de seus vícios e instintos - afastem-se dele às sextas-feiras! - e age por motivos pessoais e normalmente mesquinhos. Seus inimigos, da mesma forma, são incomuns: o diminuto Maníaco Flatulento, que polui o ar com seus gases intestinais; a estonteante Pane, que destrói os aparelhos eletrônicos apenas com o olhar; e o Capitalista Imundo, que suja o ambiente com suas imundícies. Isto, para não falar de sexo, violência e mediocridade (com os quais ele celebra uma trégua, pois ninguém é de ferro...).
O apogeu de uma era
No entanto, as peculiaridades de herói e vilões não representam o único atrativo das aventuras de Overman. Especialmente interessantes são, também, as excursões metalingüísticas que Laerte faz no próprio ambiente dos quadrinhos, como o capítulo O apogeu de uma era, em que o autor relata a evolução do aventureiro, desde sua suposta aparição em 1959 até o momento atual, reproduzindo as fases que vários super-heróis dos quadrinhos mainstream tiveram que enfrentar (a criação por parte de um desconhecido autor, que vende a personagem por uma migalha para uma grande editora, o aspecto rústico inicial, a troca de desenhistas, a evolução nos anos 60, acompanhando a liberação de costumes, a busca de alternativas mercadológicas para melhora nas vendas, etc.). Outra tirada interessante é a reprodução de uma carta de leitor fanático, que aponta uma discrepância nas aventuras do herói. Todo o conjunto é levado aos leitores com um humor fino e irônico, uma das maiores características do autor, talvez a grande responsável por seu sucesso junto aos leitores.
O autor
Laerte Coutinho é um nome consagrado dos quadrinhos brasileiros, sobre quem muito pouco é necessário dizer, pois é muito conhecido do público leitor. Atuando em quadrinhos desde 1970, quando colaborou na revista Sibila, passando depois, nos anos seguintes, pelo antológico fanzine Balão, que fundou na USP em parceria com Luis Gê, e participação nas publicações Banas e Placar, além de intensa participação na imprensa sindical. Em anos de intensa produção artística, colecionou diversos prêmios e teve participação decisiva nas principais publicações de quadrinhos do país, destacando-se os gibis Circo e Piratas do Tietê, esta última concentrando personagens de sua autoria. Tem trabalhado regularmente para diversos jornais no país, destacando-se na Folha de São Paulo, onde, em 1991, lançou a tira Piratas do Tietê. Além destas últimas, ele tem também outros tipos muito populares, destacando-se Hugo, Gato e Gata, os moradores do Condomínio e Fagundes.
Overman, protagonista do álbum lançado agora, vive suas aventuras há cinco anos no jornal Folha de São Paulo, tendo já mais de 400 tiras publicadas. O álbum apresenta uma seleção de 150 tiras, agrupadas segundo temas específicos, enfocando o local de moradia do herói, seus inimigos, seus vícios, suas dificuldades pessoais, sua vaidade, entre outros.
Overman - O Álbum, O Mito é publicado pela Editora Devir, com produção editorial da Jacarandá Edição e Design. No formato 21X 28 cm., a publicação tem 48 páginas coloridas, e custa R$ 23.00.
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