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Chuva é Cantoria na Aldeia dos Mortos | Filme luso-brasileiro é o favorito da mostra Un Certain Regard de Cannes

Protesto em prol da demarcação das terras indígenas marcou a sessão

16.05.2018, às 22H14.
Atualizada em 17.05.2018, ÀS 04H06

Iniciada com um protesto nas escadarias do Palais des Festival em prol da demarcação das terras indígenas e do fim dos etnocídios, a sessão da coprodução luso-brasileira Chuva é Cantoria na Aldeia dos Mortos, na mostra Un Certain Regard do 71º Festival de Cannes, terminou com um desabafo de um veterano crítico francês: “Não há razão de um filme bonito como esse não estar concorrendo, sobretudo diante de tanta bobagem que foi indicada este ano por aqui”. Metros adiante, um resenhista espanhol disse o mesmo ao Omelete: “Em 30 anos de carreira, eu nunca vi uma abordagem da realidade dos índios tão íntima e tão poética”. O aplauso vigoroso no fim da exibição já era indício de algo positivo para este ensaio metafísico sobre o virtude e o fardo de tradições e rituais entre o povo Krahô, rodado pela paulista Renée Nader Messora e pelo lisboeta João Salaviza em terras do Tocantins, em película 16mm.

Estive lá em 2009, para trabalhar num filme sobre o registro de uma festa de fim de luto, ritual feito um ano depois de uma morte, e acabei me encantando por aquele universo”, disse Renée, antes da exibição, quando ela e seus colegas exibiram cartazes cobrando o fim do genocídio indígena e a proteção do espaço dessas populações. “A ideia de ‘Chuva...’ é ser um filme horizontal sobre as transformações de uma espécie, feito com os Krahô, mas como ficção”.

A partir de uma delicadíssima construção visual, pautada por uma aproximação suave entre a câmera e os corpos dos índios, Renée e Salaviza acompanham a luta do jovem Ihjãc (Henrique Ihjãc Krahô) para lidar com um ritual funeral que exige dele um entendimento da permanência e da finitude. É um filme filosófico, de ritmo lento, mas de uma beleza plástica arrebatadora, que abre uma cultura distante para as plateias de Cannes. É o longa de maior cacife entre os concorrentes da Un Certain Regard, que serão julgados por um júri presidido pelo ator Benicio Del Toro. Seu título internacional é The Dead and The Others. Vale lembrar que um outro longa nacional sobre índios, o documentário Ex-Pajé, de Luiz Bolognesi, foi premiado com uma menção honrosa no Festival de Berlim.

Nesta quarta (16), em sua competição, Cannes recebeu o coreano Burning, de Lee Chang-dong, no qual um rapaz aceita cuidar do gato de uma amiga por quem se encanta. Um fetiche piromaníaco do personagem literalmente aquece o tom de mistério do novo filme do realizador de Poetry (2010). Na madrugada, a Croisette foi pra cama nos acordes de "Run To You" e "I’ll Always Love You", do filme O Guarda-Costas (1992), que tem seus bastidores retratados no documentário Whitney, de Kevin Mcdonald (O Último Rei da Escócia), encarado aqui como sendo um concorrente ao Oscar nato. É um estudo sobre a carreira de Whitney Houston (1963-2012), como cantora e atriz, ressaltando os episódios mais trágicos de sua vida.

Na quinta, Cannes recebe um potencial risco para Spike Lee e seu BlackKklansman no que diz respeito ao favoritismo do cineasta americano na briga pela Palma de Ouro, com seu thriller sobre um policial negro infiltrado na Ku-Kux-Klan. Há quem diga que a libanesa Nadine Labaki tem tudo para ser a segunda mulher a ganhar uma Palma, com seu Capharnaüm. Antes dela, só a neozelandesa Jane Campion levou o prêmio, com O Piano, em 1993. O festival termina neste sábado, com a premiação e a projeção do novo Terry Gilliam: The Man Who Killed Don Quixote. O Brasil já ganhou uma homenagem significativa na Croisette este ano: o Grand Prix da Semana da Crítica, conquistada nesta quarta por Diamantino, de Gabriel Abrantes e Daniel Schmidt, também em duo do cinema nacional com Portugal.

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