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Filmes
Crítica

Sobra propósito, mas falta precisão, no bom Satisfação

Alex Burunova estreia com drama climático - até demais

3 min de leitura
02.11.2025, às 06H00.

Créditos da imagem: Emma Laird em Satisfação (Reprodução)

Nos últimos anos, como um curioso produto derivado dos best-sellers literários de ensejo feminino e ambientação praiana, surgiu também nos cinemas a ideia do “dramalhão de férias tropicais”. E esses filmes (como A Filha Perdida, Aftersun, Hot Milk) são essencialmente atos de equilíbrio – poemas tonais ditados pelo sal do mar, a aspereza da areia e o Sol nauseante, eles precisam ser também construções dramáticas robustas, para convencer o espectador da validade do seu experimento. Se a ideia é mostrar como o desacelerar do litoral impõe o confronto de traumas, afinal, é bom que a revelação desse trauma tenha impacto.

Satisfação é o mais novo exemplar desse “sub-sub-subgênero” de draminha independente. Na trama da diretora e roteirista Alex Burunova, estreante em longas-metragens, Lola (Emma Laird) e Philip (Fionn Whitehead) se escondem em uma casa pós-moderna numa ilhota da Grécia a fim de que ele termine de compor um álbum, mas os silêncios magoados entre o casal indicam que algo a mais existe na escolha por esse retiro da sociedade. Adicione aí Elena (Zar Amir Ebrahimi), moradora local que se envolve com Lola, e os flashbacks que Burunova vai costurando na narrativa, e pronto: você tem a receita de um mistério traumático pronto para desvendar.

Durante conversa com o público antes da minha sessão de Satisfação, na 49ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, a diretora contou que a trama do longa é parcialmente baseada em um período de sua própria vida. E percebe-se sem muito esforço, de fato, o caráter profundamente pessoal da obra, o seu esforço para articular as emoções extraordinariamente difusas de uma situação como a que ela retrata. Relacionamentos raramente são preto-no-branco, e todo relacionamento de tintas abusivas encerra em si pelo menos algum grau de autoilusão.

É valente a tentativa deste filme, então, de transmitir o estado liminar de razão onde se encontram os seus personagens. Máté Herbai (Corpo e Alma) fotografa as paisagens gregas com um quê de revista de arquitetura, mas há intenção por trás de cada um dos espaços vazios, blocos de cores, iluminações oblíquas que ele escolhe – Satisfação é lindo de olhar, mas também incomodamente sufocado, exatamente como sua protagonista deve se sentir. Enquanto isso, um verdadeiro time de montadoras (Nina Annan, Isabelle Dedieu, Julie Monroe e Anita Roth) ajuda Burunova a esculpir um texto que esbarra na poesia minimalista, e a entender o ritmo dos flashbacks diante da linha narrativa principal.

Trata-se de uma colaboração comendável entre todos esses artistas – e outros, a passar por um trio de atores principais exemplarmente comprometidos –, mas Satisfação passa pela tela deixando a impressão de uma obra cheia de propósitos, e poucas ideias sobre como alcançá-los. O miolo do filme é especialmente problemático, é claro, oscilando entre intenções que se chocam (ora thriller psicossexual, ora drama denúncia) e esticando o movimento de virada nas relações dos personagens de maneira indefensável até sob o guiso de construção de clima. Até porque o clima, a essa altura, já está lá.

De certa forma, então, é uma falta de precisão que tira Satisfação dos eixos do grande filme que ele poderia ser – e os seus companheiros de “trauma à beira-mar” também falharam ou triunfaram a partir do controle que souberam manter sobre sua dramaturgia. Colocar o público no espaço correto para encontrar os personagens e suas feridas é fundamental, mas nos deixar marinando nesse espaço por tempo demais, e por pouca recompensa, é perigoso. Desequilibrado nessa receita, Satisfação perde o sabor até de suas (não poucas) virtudes.

*Satisfação foi exibido na 49ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo. Ainda não há previsão de estreia no circuito comercial brasileiro.

Nota do Crítico

Satisfação

Satisfaction

2025
96 min
País: EUA, Ucrânia, Itália, Grécia, Reino Unido
Direção: Alex Burunova
Roteiro: Alex Burunova
Elenco: Emma Laird, Zar Amir Ebrahimi, Fionn Whitehead