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Por cerca de três anos e meio, desde fevereiro de 1999, a DreamWorks, atual rival da Disney no campo das animações, produtora de Shrek (de Andrew Adamson e Vicky Jenson, 2001), trabalhou em um projeto sobre a história da conquista do oeste norte-americano no Século XIX - sob o ponto de vista dos cavalos selvagens. Durante dois anos, os títulos da produção variaram de simplesmente Spirit a Spirit of the west. Havia um consenso, porém: humanos não devem falar, mas os animais conversam e protestam, como numa legítima trama voltada às crianças. Quando muita coisa já estava decidida, Jeffrey Katzenberg, produtor do desenho, um dos mentores da DreamWorks, propôs a reviravolta: Se os animais falam, logo tudo se torna comédia. E não queremos isso. Assim, em prol de um certo realismo, presenteou nativos e desbravadores com a voz, emudecendo águias, búfalos e cavalos. A decisão pode parecer singela, sem importância, mas confere a Spirit - O corcel indomável (Spirit - Stallion of the cimarron, de Kelly Asbury e Lorna Cook, 2002) uma aura especial. Em meio à concorrência selvagem das tramas implausíveis e das personagens extravagantes, a proposta de Katzenberg enriquece sua película, feita com animação tradicional, transformando-a num produto simples e honesto. Enquanto especialistas em anatomia e paleontologistas foram chamados a opinar na criação das personagens, um garanhão da raça Kiger, comprado por 50 mil dólares, serviu de modelo na criação do Spirit. O Kiger, apelido Donner, possui traços genéticos dos cavalos selvagens da época, trazidos pelos conquistadores espanhóis no Século XVI. A trama, agora conduzida por um narrador, como se fosse a consciência de Spirit, retrata o indomável do título desde seu nascimento à maturidade, em pleno vigor físico, líder entre seus pares. Daí, quando os desbravadores começam a instalar quartéis, estender ferrovias e mortificar os nativos, o corcel reage - e desafia os invasores, com a ajuda de um índio, Pequeno Rio. A posição política fica evidente já no prólogo: Talvez a conquista seja, na verdade, um derrota. Sobriamente, trata-se de um tema sério sem tolher os atrativos infantis. Spirit pode ser, assim, um faroeste digno, com boas seqüências de ação, mas também serve de mero entretenimento de férias. As personagens são carismáticas e simplificadas o suficiente para cativar as crianças. Porém sempre existe aquele senão. A trilha-sonora funciona como instrumento didático - no original, o canadense Bryan Adams; na versão dublada, Paulo Ricardo. As canções ajudam os pequenos a acompanharem a trama, mas a quantidade excessiva, seis composições durante os oitenta minutos de projeção, pode desagradar os crescidos. Comparativamente, Spirit não têm nada a ver com o debochado Shrek ou com o hilário Lilo & Stitch (de Dean Deblois e Chris Sanders, 2002). Parece-se mais com um Rei Leão (The lion king, de Roger Allers e Rob Minkoff, 1994), mudo, sem a face cômica de Timão & Pumba, só com o peso da boa narrativa. Katzenberg estava coberto de razão. Comecei a gostar mais de Spirit quando, dias depois da sessão, imagens e passagens inteiras ainda estavam na minha cabeça. Faça assim: esqueça a falta de criatividade de Adams e a falta de fôlego do RPM. Concentre-se nas paisagens bem trabalhadas, nos momentos de poucos diálogos e sempre de muita inspiração. Se a sua irmãzinha insistir em ver, bote fé e a acompanhe.
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Spirit - o corcel indomável Direção: Kelly Asbury e Lorna Cook |
Imagens © Dreamworks Pictures
