Filmes

Entrevista

Omelete Entrevista: Meryl Streep, Nora Ephron e Amy Adams

Uma conversa com as protagonistas e a diretora de Julie & Julia

27.11.2009, às 19H00.
Atualizada em 18.11.2016, ÀS 21H02

Em Julie & Julia, duas histórias femininas - a da blogueira Julie Powell e a da cozinheira e apresentadora Julia Child - são intercaladas, apesar das décadas que as separam. Amy Adams e Meryl Streep, que interpretam, respectivamente, Julie e Julia, conversaram com a imprensa em Los Angeles, ao lado da sua diretora no filme, Nora Ephron, cineasta conhecidíssima por suas comédias românticas. Na entrevista elas falam sobre comida (claro), suas carreiras, os desafios do filme e mulheres em Hollywood. Confira!

Nora Ephron: Eu prometo que não vou dizer hoje nada do que eu já disse antes. Tudo que estou prestes a dizer, eu nunca disse antes.

Julia e Julia

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Julia e Julia

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Julia e Julia

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Julia e Julia

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Ótimo! O filme é muito bom.

NE: Obrigada, nós nos divertimos muito.

Meryl, como você se tornou a Julia Child, a sua Julia Child? Foi algo natural ou simples para você?

Meryl Streep: Bom, sabe ela já era muito familiar para mim, desde a época em que eu estava na oitava série. Eu meio que a conhecia, ou pensava que conhecia. E aí quanto mais eu lia sobre ela, sobre como sua vida era rica e maravilhosa... mais eu me lembrava, de diversas maneiras, da minha mãe. Minha mãe tinha um espírito parecido, o amor por acordar todos os dias e fazer o que ela precisava fazer. E eu não sou sempre assim, então eu gostei da oportunidade de interpretar alguém assim, incrível e positiva.

Ela era muito apaixonada. Você sentia essa paixão por alguma coisa em especial quando estava crescendo? Pela atuação? Porque ela era muito apaixonada pela vida, além da culinária. Você se identificou com ela de alguma maneira?

MS: Bom, como eu disse... Eu acho que eu me identifiquei com ela porque eu sempre quis ser mais como a minha mãe, então eu gostaria de ser mais como a Julia Child. Mas eu não sou assim, não. Eu tenho dias ruins e outras coisas, complicações. Essa foi a nossa versão idealizada de Julia Child, eu tenho certeza que ela tinha esses dias também.

NE: Eu não tenho tanta certeza. Sabe, aquela coisa que você tem que você fica de mau-humor? Eu acho que ela não tinha muito disso.

MS: Bom, eu nunca a conheci, mas recebi uma carta muito mal-humorada dela uma vez. Eu escrevi a ela tentando conseguir ajuda no início do movimento Slow Food, em 1989. Eu estava trabalhando com um grupo tentando trazer vida, cultura e alimentos orgânicos aos supermercados locais e pensei "Nós deveríamos tentar envolver a Julia". E ela escreveu uma resposta muito brusca e grossa.

Você lembra do que ela dizia?

Amy Adams: Oi pessoal! Eu estou só 3 minutos atrasada, de acordo com aquele relógio. Desculpa.

Nós estávamos só pensando se a Julia era um pouquinho mal-humorada às vezes.

NE: Eu não acho que isso qualifica como mal-humorada, porque era uma coisa política, de certa maneira. Ela achou que você estava errada, mas isso é diferente de acordar de mal-humor, sabe.

MS: Isso é verdade, absolutamente verdade.

O que você acha que a Julia Child significa, em termos de cultura estadunidense, em relação à comida e cultura. Porque obviamente em outros países, como o Brasil, essa pode ser a primeira vez que algumas pessoas ouviram falar dela.

NE: Bom... Quando as pessoas dizem que ela mudou a vida como nós a conhecemos, a vida como conhecemos provavelmente teria mudado mesmo assim. Mas ela veio em um momento em que as pessoas estavam prontas para parar de simplesmente abrir latas. Sabe, na minha casa uma coisa que nós amávamos era batatas à escalope, e aliás nós tínhamos uma ótima cozinheira, mas a maneira como nós fazíamos as batatas à escalope era fatiando as batatas e aí abrindo uma lata de sopa Campbell's de cogumelos e derramando-as em cima das batas. E a propósito, era delicioso! Elas ficavam completamente deliciosas, mas o negócio é o seguinte: é igualmente fácil colocar um creme e fatiar uns cogumelos. E as pessoas estavam prontas para descobrir isso. E ela foi a pessoa que surgiu nesse momento, em que as mulheres, e os homens, começaram a compreender que eles poderiam ser ótimos cozinheiros e isso não levaria muito mais tempo que ser um péssimo cozinheiro. E todos cozinhavam naquela época, bem ou mal. Não é como agora, que as pessoas pedem tanta comida pra entregar.

E do que vocês gostam como cozinheiras. Quero dizer, vocês mesmas. Vocês cozinhavam antes, começaram a gostar depois do filme, não eram muito boas ou...

AA: Eu não diria que eu sou realmente boa. Mas eu posso te alimentar, sabe... [risos] Eu poderia alimentar um exército, cresci com sete irmãos e aprendi a cozinhar em quantidade. Então tem sido uma grande revelação fazer uma omelete com dois ovos. Sabe, numa panela com manteiga, uma omelete por vez.

Eu estava lendo aqui nas notas que você era um pouco traumatizada, assim como a sua personagem, para cozinhar a lagosta.

AA: Sim, eu estava.

Você ainda sente isso?

AA: Eu não como lagosta desde então. Eu não tenho problemas com siris, por algum motivo, mas lagostas...

NE: É porque você nunca se deparou com um siri!

AA: Tem razão, não me encontrei com nenhum siri mas...eu tinha um problema com isso.

Quais são as suas receitas preferidas, e receitas preferidas da Julia Child, que você poderia contar pra gente?

MS: Eu... Bom, eu acho que o frango rosé dela é meio que impossível de dar errado. Sabe, você acha que é só um frango rosé e coloca ele no forno, mas há pequenos detalhes nessa receita que a tornam ótima, que fazem dela uma ótima refeição. Eu lembro da primeira vez que eu a fiz e todos olharam com uma cara de "Frango?", sabe. Mas depois disseram que estava maravilhoso, então é só uma questão de quando dourar; quando a manteiga fica certa; a combinação certa de manteiga e azeite de oliva e quando você acrescenta isso, aquele momento da fervura e você realmente tem que esperar isso; você tem que lavar a ave mas depois secá-la muito, muito bem - o que eu nunca fiz. Só esses pequenos elementos, e como rechear o frango e com o que, e como virá-lo com colheres de madeira, coisinhas para que a pele do frango não quebre, ela faz coisinhas assim que fazem a comida ficar ótima.

Meryl, você é uma grande estrela comercial, e nos seus últimos dois filmes poderíamos dizer que novas gerações estão te descobrindo, as pessoas continuam indo aos cinemas. Como é isso pra você, ver pessoas de 20 anos...

MS: É surpreendente e maravilhoso! Mas eu não sei, eu devo dizer que não me avalio por nada disso. Realmente. Eu fico chocada que agora meninas de 13 anos vêm e querem muito me conhecer! [risos] Elas vêm com muita empolgação e isso é novo, realmente novidade. É ótimo.

Mas isso é uma coisa muito difícil de conquistar, para uma mulher nesta época e recomeçar, renovar.

MS: Eu não acho que eu renovei nada. Eu acho que alguém investiu dinheiro nesses filmes sobre mulheres e sabe-se lá por que eles decidiram fazer isso. Mas provavelmente com Diabo Veste Prada rendendo tanto dinheiro e deixando todos tão surpresos houve uma comoção com isso. E depois Mamma Mia! foi lá e fez a mesma coisa e eles novamente ficaram chocados, chocados. Que esse filme ia atrair não só os fanáticos e sim que ia se sair bem e se tem dinheiro nisso então... E nós somos as beneficiárias disso, com nosso filme sobre culinária.

Amy, por você ser de outra geração, você sente que pra você começar foi mais fácil do que pra elas?

AA: Bom, acho que há uma falta de perspectiva se olharmos do meu ponto de vista. Dito isto, eu sinto muita gratidão em relação às mulheres que construiram o caminho, não só no cinema, mas também no mundo. Tipo, ouvir a Nora e como foram algumas das experiências dela com a Casa Branca e a imprensa. E estar naqueles escritórios esfumaçados com todos aqueles meninos, sabe? E a Meryl e todo o trabalho que ela conquistou e o respeito dela, com certeza cimentaram o caminho, não apenas para as atrizes mas também para as mulheres. E eu sou grata por isso, então eu realmente acho que elas abriram o caminho. Mas nós ainda temos que andá-lo por nós mesmas, mas elas abriram.

Eu gostaria de perguntar sobre uma das subtramas do filme, sobre amizade feminina. Porque é interessante que os homens são fantásticos e compreensivos, mas já as amigas da Julie...Você poderia falar um pouco sobre o que isso diz sobre as mulheres e amizades?

NE: Sabe, eu acabei de ler uma matéria muito briguenta em algum lugar, acho que foi no Wall Street Journal ou algo assim, não consigo me lembrar direito. Foi escrita por uma mulher que tinha lançado um livro sobre amigas mulheres e ela estava muito nervosa porque dizia que as amizades femininas são sempre distorcidas nos filmes. No cinema elas são mostradas como alegres e fabulosas... e eu pensei "Bom, espera então até ela assistir ao nosso filme!". [risos]

Eu me diverti muito com isso, porque comecei com a verdade, que era que Julia e Simca estavam bravas com a Louisette, porque ela nunca aparecia. E aí elas tiveram realmente uma discussão sobre qual percentual do dinheiro Louisette ia receber. Foram meses de negociação e aí acabou que, depois, elas ainda conseguiram ainda mais vantagens. Depois que o livro se tornou um sucesso eles baixaram os royalties dela ainda mais. Então eu tinha isso de fato em um lado da história, então pensei que seria divertido ter um pouco disso no outro lado. Mas eu acho que as mulheres podem ser amigas fantásticas, mas isso não é tudo o que acontece. As mulheres também são competitivas e ciumentas, assim como seres humanos normais. E foi divertido mostrar um pouco disso.

Vocês duas tiveram só uma cena juntas, certo? Vocês poderiam falar um pouco sobre ela e como foi filmar?

MS: A última cena da Amy era o meu primeiro dia. E fizemos turnos a noite mas nós já tínhamos nos entrosado muito em Dúvida, que ela tinha encerrado duas semanas antes que nós começassemos a filmar Julie & Julia então, nós não tínhamos uma cena juntas. Mas nós nos encontramos num corredor.

AA: Mas eu devo dizer que toda a vez que eles mudavam a iluminação me dava calafrios porque eu sabia que você ia entrar.

Amy, a sua personagem está em um momento de passagem, porque vai fazer 30 anos. Você se identifica com isso? Eu vi nas anotações que você disse que se sentiu assim antes.

AA: Foi quando eu estava fazendo 30 anos, exatamente. Foi no verão antes do meu aniversário, eu tive toda uma crise de identidade. Me perguntava: O que eu estou fazendo? Quem sou eu? O que eu gostaria de estar fazendo? Quem é você? O que eu estou fazendo aqui? Questinonava tudo, não houve uma pergunta que eu não fiz a mim mesma.

MS: Eu acho que os atores tem essa crise a cada ano de suas carreiras. Eu com certeza tenho. Porque você nunca sabe o que está fazendo. Sabe, em minha carreira eu estive mais desempregada do que trabalhando, apesar de estar trabalhando durante o que me pareceu cada segundo da minha vida. Mas, na verdade, isso é bom pra mim porque eu tenho uma família e assim eu tenho mais tempo pra eles. É algo diferente. Mas eu acho que atores, por necessidade, sempre se questionam se isso é mesmo uma coisa que vale a pena. Porque é tão incerto, você depende da vontade de outras pessoas. Você nunca se sente seguro, mas para mim é ótimo.

Meryl, como você escolhe um roteiro hoje em dia? É pelo diretor, é porque você quer fazer algo completamente diferente?

MS: Normalmente eu escolho pelo roteiro, pela escrita, a boa escrita. Eu não sei exatamente o motivo. Os roteiros que eu pego nem sempre são óbvios. Isso é algo que me atrai. Mas também existe uma coisa, a voz particular de cada coisa, que parece única e faz com que eu queira me envolver naquilo. Neste filme, eu adorei o roteiro no minuto em que eu o li, mas eu não achei que fosse dar certo. Achei que era só um palpite e que eles nunca dariam dinheiro para fazer algo tão unicamente sutil, com tantas nuances e centrado no feminino, em que os homens não são problemas e que não há crianças. O filme é sobre a relação com o trabalho, é tudo, tudo muito diferente e normalmente isso os assusta, mas não assustou.

NE: Olha, eu acho que eles ficaram assustados, mas aí a Meryl disse que ia fazer o filme e isso os acalmou. Sabe, porque essa gente não é corajosa, eles querem uma rede de segurança.

Mas esse filme não me pareceu um filme normal e comercial.

MS: Ele era peculiar, ao extremo.

NE: Sim, é verdade. Eu não pensei nele como um filme de arte. Eu pensei que era uma coisa estranha que não era um filme grande, de 80 milhões de dólares. Então ok, eles não iam nos dar 80 milhões de dólares e teríamos sorte de conseguir locações em Paris, e nós conseguimos!

Vocês entraram mesmo na experiência gastronômica, sairam muito para comer enquanto estavam fazendo o filme?

MS: Eu entrei. Eu encarei esse papel como uma gravidez, era uma desculpa. Eu não tinha que me preocupar, não era uma gatinha glamurosa.

AA: Pra mim foi logo depois de Dúvida, e eu já tinha usada as roupas de freira como desculpa, foi apenas uma extensão, para mim.

Você realmente provou todas as receitas que estava cozinhando?

MS: Sim, quase todas. E tinha tantos pratos feitos, caso a gente errasse alguma coisa. Então não tinha uma tortinha, tinham 20. A equipe gostou, foi a equipe de filmagem mais feliz de Nova York.

NE: A equipe realmente ganhou uns quiilos.

Nora, as dificuldades de Julia Child se parecem com muitas das suas dificuldades na indústria cinematográfica. Ela estava num mundo dominado por homens. Você vê esse paralelo?

MS: É, eu nunca tinha pensado nisso.

NE: Sim, mas não no mundo dos livros de culinária. Muitas mulheres tinham escrito livros de culinária. O livro que é empurrado na mesa foi um livro que nós inventamos, na vida real aquele livro era um grande best-seller escrito por uma mulher.

MS: Era outra platéia, no entanto. Julia Child mudou a culinária para as pessoas que não gostavam de cozinhar. Não foi o livro Mastering the Art of French Cooking, mas o programa dela na televisão, que levou pessoas a pensar "quem sabe eu faça Bouillabaisse", sabe? Não parecia tão difícil e ela fazia as pessoas terem vontade.

Crítica: Julie & Julia
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