Filmes

Entrevista

O Imaginário de Doutor Parnassus: Omelete Entrevista Terry Gilliam na Comic-Con 2009

Diretor conta como foi arranjar forças e ideias para terminar o filme

03.05.2010, às 22H41.
Atualizada em 10.11.2016, ÀS 05H05

Terry Gilliam fez parte de um dos melhores grupos da história do entrenimento, o Monty Python. Eram dele as vinhetas sem pé nem cabeça de pés e cabeças que vinham do nada e saíam de cena depois alguma maluquice surrealista. E só por isso já mereceria o respeito de qualquer um.

Mas ele ainda fez filmes. E dos bons! Estão lá Brazil, uma das mais cultuadas ficções científicas. O mesmo vale para o seu projeto mais pop, Os Doze Macacos, com Brad Pitt e Bruce Willis. Ou ainda o "chapado" Medo e Delírio em Las Vegas. Mas suas produções nunca são fáceis. Ele já teve que cancelar seu projeto de filmar uma versão de Don Quixote que tinha Johnny Depp como Sancho Pança por uma série de infortúnios. E quase sofreu outro revés quando, no meio das filmagens de O Mundo Imaginário do Doutor Parnassus, morreu Heath Ledger, seu astro principal, logo depois de filmar Batman - O Cavaleiro das Trevas.

O Imaginário de Doutor Parnassus

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Na entrevista a seguir, concedida durante a Comic-Con 2009, Gilliam conta como foi arranjar forças e ideias para terminar o filme, que acabou virando uma homenagem a Heath.

O que você pode falar sobre o filme sem estragar as surpresas?

Ele será impressionante visualmente, tentamos ser o mais próximos do livro possível. Quando eu estava trabalhando no roteiro, houve alguns empecilhos para transformar em imagem o que estava sendo descrito. Algumas coisas pareciam impossíveis de serem filmadas. Eu precisava respirar fundo para achar uma solução. No livro tinha uma parte falando sobre o barulho de bandeiras sobre um túmulo descritas como “donk, donk, donk”... E para o filme, como seria? Um problema e tanto...

O filme começa com o mistério de um assassinato e, aos poucos, isso vai se perdendo ao longo do filme até que nos perguntamos “onde está o assassino?”...

Muito antes de começarmos a filmar eu imaginei que acabariam fazendo uma minissérie televisiva ao invés do filme por conta deste longo mistério, mas não iria funcionar. Por isso sou muito grato ao nosso produtor ter conseguido angariar fundos para fazermos o filme (risos). Eu ficaria muito envergonhado ao final de produção se tivesse sido de outro jeito.

Qual foi o maior desafio para terminar o filme?

Bem, Heath Ledger morreu quando cerca de 40-50% do filme estava feito. O desafio foi reunir energias para acreditar que o filme poderia ser finalizado sem alguém tão importante para a trama. Mas eu estava cercado de pessoas que me incentivaram a terminar o trabalho e fazer isto por ele. Por sorte já tínhamos feito boa parte das cenas fora do espelho e dentro do espelho o personagem poderia mudar a face dependendo da situação. Então resolvemos este problema da mudança de caracterização escalando três atores para o papel. Os três eram amigos de Heath e queriam fazer isso por ele, mesmo envolvidos em outros trabalhos e sem tempo para ensaios. Então embarcamos nesta opção meio às cegas e confiando muito em nosso trabalho.

Você ficou preocupado caso não tivesse nenhuma outra opção para continuar o filme?

Olha, depois deste desafio acho que qualquer problema que surgir será muito mais fácil de resolver.

Alguma coisa que Heath Ledger filmou não entrou na versão final do filme?

Não, tudo que ele fez está no filme. E procuramos não modificar muito suas falas ao longo das cenas apesar de algumas delas serem chocantes e premonitórias e falarem sobre morte. Tem uma fala do Christopher Plummer em que ele cita histórias, romances, comédias, lendas e a inevitável morte, e foi triste perceber que Heath nunca mais iria participar de alguma outra história... Bem, está feito e as pessoas, ao verem o filme, podem não acreditar, mas tudo foi mera coincidência. Pode parecer estranho, ficamos perturbados, é claro, mas agora é difícil imaginar como seria o filme se ele tivesse interpretado todos os papéis. Várias ideias que tivemos para resolver a questão irão, com certeza, surpreender a todos.

Quanto de efeito especial foi usado no filme?

60% do filme tem computação gráfica. Também usamos modelos, maquetes, mas a maioria é CG. Quando o personagem está dentro do espelho procuramos criar um mundo diferente, um mundo irreal e sobrenatural. E com o CG conseguimos fazer isto de uma forma em que os personagens interagissem e parecesse que eles estavam ali de verdade, como nos desenhos que eu fiz.

Quem compôs a trilha sonora do filme?

Foram o Michel e Jeff Danna, eles fizeram a trilha de Contraponto. São ótimos.

Na série Monty Pyhton você fazia animação a partir de obras de arte previamente criadas. Esta experiência lhe auxiliou para trabalhar com cenas de alguém que já havia morrido, contribuindo para o processo de recriação da história?

Não, porque eu não precisei refazer a história. O que tivemos que fazer foi muito simples, apenas mudar o ator que faria os personagens dentro do espelho. A única cena que tivemos que recriar foi uma hora em que o personagem de Heath caía e a sua face mudava, foi uma das cenas em que eu usei o Johnny. Foi a única em que tivemos que mexer. O mais difícil foi decidir o que fazer com as cenas fora do espelho que o Heath ainda não tinha gravado. Algumas delas o Jude precisou fazer. Foi na quinta semana de filmagem que o Heath morreu, já tínhamos feito muita coisa então foi preciso muita calma para analisar o que iria funcionar ou não em cima do que já havia sido filmado. É muito difícil editar um trabalho póstumo para não cortar o essencial. Estou até pensando em colocar nos créditos o Heath na co-direção (risos) porque muito foi decidido em cima do trabalho dele. O filme ficou assim por causa dele. Uma noite estávamos em Vancouver com ele, e no dia seguinte não...

Lily Cole, conhecida por ser modelo, está no seu filme. Como foi o trabalho dela?

Ela faz a filha do Parnassus, e o trabalho de Lily foi extraordinário no sentido de ela parecer atlética o suficiente para o papel. Os shows de Lily precisavam parecer extraordinários e conseguimos fazer com que parecesse que ela estava saltando de grandes alturas. Queríamos alguém que parecesse jovem, mas que já fosse maior de idade para evitar qualquer problema com a lei (risos) e ela sabe realmente como atuar, achei que ela seria interessante para o papel. Quando nos conhecemos eu percebi o quanto ela sabia atuar em cenas de maior ação, além de ser muito inteligente. Ela soube contribuir com sua experiência em cenas perigosas.

Fazia muito tempo que o ator Christopher Plummer não tinha um papel tão grande no cinema. Qual foi a contribuição dele para o filme?

Ele trouxe todo o seu talento para o filme, ele é um ator extraordinário. Ele tem um histórico no teatro e em grandes produções cinematográficas como A Noviça Rebelde. Teve um dia no set que ele ficou cantarolando a música do filme (risos). Ele fazia isto para me irritar. Teve uma cena que estávamos ensaiando e o Parnassus precisa entrar de uma certa maneira e ele não concordou. Mudamos a cena do jeito que ele sugeriu e foi perfeito! O bom de ter um ator teatral trabalhando com você é que ele saber enfatizar e acentuar as falas no momento certo.

Como foi filmar em Londres (Inglaterra) e Vancouver (Canadá), as locações do filme?

Ficamos cerca de um mês filmando em Londres e depois fomos para o Canadá gravar as cenas dentro do espelho. Filmamos todas as cenas externas em Londres, tentando ao máximo capturar a essência da cidade. Filmamos poucas externas em Vancouver, a maioria foi com fundo azul para os efeitos visuais.

Para filmar as fantásticas imagens do filme, você utilizou story boards ou estava tudo em sua cabeça?

Eu fiz story boards apenas para as cenas com efeitos especiais. O que vemos em live action eu não fiz story board, apenas filmei. Quando trabalhamos com CG é necessário para nos orientar nas filmagens, mas fora isso é frustrante ver que o que decidimos previamente não vai corresponder com a realidade filmada. Como eu tenho receio de tornar a coisa muito mecânica e mesmo no CG eu tento quebrar este aspecto mecânico, eu procuro evitar. Foi um processo importante para ajustarmos o que seria usado de cenas fora do espelho com Heath Ledger e o que seria filmado dentro do espelho com Colin Farrell, Jude Law e Johnny Depp usando CG. Era algo que às vezes a gente recorria nas externas para controlar a situação durante as filmagens, mas éramos flexíveis para utilizá-lo ou não. Sempre consultávamos o elenco para que eles também sugerissem situações. O Johnny foi o primeiro a falar que estava no projeto depois do ocorrido. Eu perguntei se ele podia participar e ele me disse que qualquer coisa que precisasse era só pedir. Foi um pouco difícil porque ele estava envolvido com as filmagens de Inimigos Públicos...

Ainda falando sobre Johnny Depp houve um certo receio que ele misturasse a interpretação desse filme com a do Chapeleiro Maluco em Alice no País das Maravilhas?

Nós conversamos sobre isso e optamos por filmar em épocas diferentes para não misturar as coisas e ele é até meio supersticioso com essas coisas então deixei por conta dele, por ele ser bem mais esperto do que eu (risos).

A partir de agora você sempre terá um Plano B caso aconteça algo durantes as filmagens?

Não, eu sempre procuro fazer uma coisa de cada vez. Eu não sei dividir a minha atenção quando estou focado em apenas uma coisa. É claro que nunca imaginamos que certas coisas vão acontecer, o jeito é ficar ali 1, 2 anos e se não der certo, bola pra frente. Ás vezes demora tanto para finalizar um filme que ele pode ficar ruim ou não, independente do tempo gasto.

Leia a crítica de O Mundo Imaginário do Dr. Parnassus, que estreia nessa sexta, 7 de maio.

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